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A filha da feiticeira - Paula Brackston

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vegetação. À esquer<strong>da</strong> <strong>da</strong> casa, no entanto, algo chamava a atenção. Naquele<br />

instante, no escuro, pareciam ser dois dragões sentados, dormindo, com as cabeças<br />

curva<strong>da</strong>s, exalando a fumaça de sua respiração no ritmo lento de seus corações<br />

sonolentos. Em uma inspeção mais próxima, percebia-se que aquelas maravilhas<br />

não eram criaturas fantásticas, mas sim obra do homem, pois eram repositórios de<br />

carvão de Gideon. Havia, ao menos, dois deles acesos noite e dia, enquanto os<br />

outros ao redor esfriavam, sua colheita quebradiça passando calmamente de<br />

madeira em chamas para frágeis pe<strong>da</strong>ços de negridão, esperando para serem<br />

levados de suas camas feitas de cinzas. À medi<strong>da</strong> que Bess se aproximava <strong>da</strong>s<br />

cavi<strong>da</strong>des trepi<strong>da</strong>ntes, podia sentir o calor assustador, apesar <strong>da</strong> cama<strong>da</strong> de relva<br />

que os cobria e impedia a entra<strong>da</strong> de ar. Para ela, era incrível que o fogo não<br />

escapasse e devorasse o chalé e a floresta inteira. Afastou-se rapi<strong>da</strong>mente <strong>da</strong>quelas<br />

coisas assustadoras e seguiu em direção ao chalé. Quando levantou a mão para<br />

bater, a porta foi aberta bruscamente. Gideon devia tê-la visto se aproximando. Os<br />

dois se entreolharam sem palavras, o trepi<strong>da</strong>r distante do carvão queimando era o<br />

único som naquele silêncio pesado. Finalmente, Gideon mudou de lado e fez um<br />

gesto para que ela entrasse. Mesmo naquele momento, Bess achou difícil de<br />

acreditar que ela própria estava se colocando voluntariamente aos cui<strong>da</strong>dos de um<br />

homem que sabia ser capaz de estuprar e matar a sangue frio. Isso <strong>da</strong>va uma ideia<br />

de sua angústia, de sua dor, de sua sensação inabalável de desesperança, de que ela<br />

não se importava mais com o que lhe acontecesse.<br />

A casa consistia em único cômodo mal-iluminado por dois lampiões. A única<br />

outra iluminação vinha <strong>da</strong>s chamas que ardiam na lareira de pedra. Havia duas<br />

cadeiras perto do fogo, uma pequena mesa com um banco, uma série de armários e<br />

uma cama grande de penas no canto afastado do ambiente. Bess se virou para<br />

encarar Gideon. Ela estava prestes a falar quando ele disse:<br />

— Sua mãe está morta.<br />

Era uma afirmação, não uma pergunta, e tão desprovi<strong>da</strong> de sentimento que<br />

era impossível para Bess interpretar como um consolo ou uma ofensa. Ela apenas<br />

concordou com a cabeça e disse:<br />

— Foi minha mãe que... Ela me disse para vir até você.<br />

Gideon se aproximou, deixando seus olhos percorrerem todo o corpo de<br />

Bess, inclinando a cabeça um pouco de lado. Apesar de seu cansaço, Bess descobriu<br />

que ain<strong>da</strong> tinha energia para indignar-se com o tratamento dele. Ali estava ela,<br />

recentemente enluta<strong>da</strong>, sozinha no mundo, angustia<strong>da</strong> e exausta, e ele não tinha

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