PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
-nascido, cuja impureza advém da sua identificação com as relações<br />
sexuais que estão na origem” (Quintino, 2004: 303).<br />
“Eu cá era difícil fazer isso, mas quase fiquei em casa o tempo<br />
todo, só saí para ir ao supermercado comprar qualquer coisa. Não<br />
tinha ninguém, era só eu e ela”. (Mariatu, 44 anos, origem<br />
guineense, mãe de Diminga)<br />
“Se seguir a religião, até completar os quarenta dias a mãe não<br />
pode ir para a rua. Eu tive que ir, porque a vida hoje em dia obriga,<br />
porque temos que ir ao médico, temos que ir tratar de umas<br />
coisas... Mas assim, sair, andar aí, por acaso essa parte eu cumpri,<br />
só saía quando ia ao médico. Mas hoje em dia a mãe trabalha,<br />
embora agora já dão três, quatro meses, não é Mas, às vezes,<br />
com esses casos de crise de trabalho, a pessoa, para não perder<br />
o trabalho, vai trabalhar mais cedo, não é” (Fatimah, 58 anos,<br />
origem indiana)<br />
Após o período de recolhimento, a criança é apresentada à família<br />
alargada e à comunidade e todos tomam conhecimento do nome que lhe<br />
é atribuído. A este propósito, o discurso de Diminga constitui um exemplo<br />
particularmente representativo das dificuldades, inerentes à circunstância<br />
migratória, de realização de determinadas práticas culturais, como<br />
pode ser a própria escolha do nome, neste caso ajustada e transformada<br />
pela jovem e até pela mãe desta, entre o desejo de manter os costumes e<br />
a necessidade de adaptação à sociedade onde se inserem:<br />
“Eu fiquei no hospital cinco dias e depois viemos para casa, logo<br />
fomos tratar de fazer o registo dele, tentar pôr o nome dele. Tanto<br />
que deu também alguma complicação, porque eu queria pôr [X],<br />
que é o nome do meu pai. Só que, depois, sabes que na escola as<br />
pessoas gozam com nomes esquisitos, né E eu era assim: «Olha,<br />
vai [X e Y], a família chama [X], quem quiser chama [Y]». Quando a<br />
gente foi para pôr [X], no registo não deixaram, disseram que tinha<br />
que ir à mesquita que era para fazer a papelada, e não-sei-quê,<br />
em que na religião tem aquele nome. Quando chegámos lá na<br />
mesquita, ele foi com o nome de [Y] primeiro, também não<br />
deixaram. (…) Pronto, depois lá se fez”.<br />
(…)<br />
“A minha irmã mais velha, lá na Guiné, quando fizeram o<br />
baptizado, o nome dela era [X], mas ela, quando veio para aqui e foi<br />
para registar, já não deixaram. (...) As únicas pessoas que chamam<br />
ela de [X] são as pessoas que estão lá na Guiné. E depois, já a<br />
minha outra irmã, o nome dela ficou [X], mas o nome dela na Guiné<br />
é [Y]. Na altura, acho que foram ver na lista um nome parecido<br />
(...)”. (Diminga, 25 anos, origem guineense, filha de Mariatu)<br />
Maria Abranches<br />
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