PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
deixei, até a gente separar. Se ele dissesse, eu dizia: «Não, não<br />
quero, não quero». Nem consentia”.<br />
[O seu segundo marido também não tem outras mulheres]<br />
“Não”.<br />
[E alguma vez lhe propôs]<br />
“Não, por enquanto não. Não sei depois”.<br />
[Se isso vier a acontecer, vai dizer que não]<br />
“Outra vez. Eu não suporto isso”. (Fulé, 44 anos, origem<br />
guineense)<br />
A questão da poligamia representa, de forma explícita, as estratégias de<br />
negociação simbólica na constante adaptação das tradições do grupo de<br />
origem à conformidade com o país de acolhimento, sobretudo face a<br />
aspectos que, como é o caso da poligamia, constituem factores de limitação<br />
à realização pessoal destas mulheres. Assim, a migração pode constituir,<br />
para estas mulheres, uma forma de transformar estrategicamente<br />
práticas socioculturais tradicionais como esta, aproveitando a influência<br />
do padrão monogâmico da sociedade receptora. Como já foi referido no<br />
capítulo 1, as estruturas familiares poligâmicas são, muitas vezes, alteradas<br />
com a migração, sendo este um dos motivos que leva algumas<br />
destas mulheres a preferir a vida em Portugal. As jovens de ambos os<br />
grupos, por seu lado, manifestam todas elas a recusa da poligamia:<br />
“Pronto, isto para eles, lá em África, isto é normal, não é O<br />
homem é muçulmano, pode ter mais que uma mulher. Tanto que<br />
eu tenho um tio meu que até está cá, tem lá na casa dele duas<br />
mulheres, vivem as duas na mesma casa. O meu avô teve quatro<br />
mulheres... Isso vê-se muito. (...) Eu não concordo nada com isso,<br />
isso é uma das coisas que eu discordo”. (Tchambu, 24 anos,<br />
origem guineense)<br />
“Olha, eu sinceramente sou contra isso de o homem estar a<br />
arranjar duas mulheres, três... Sou contra. Mas, pronto, sabes<br />
que as pessoas lá na Guiné já nascem com aquela mentalidade,<br />
desde criança já viram”. (Diminga, 25 anos, origem guineense)<br />
“Bom, isso é uma questão muito complicada, porque é assim...<br />
Olha, é permitido, é verdade, a poligamia, mas dentro de certas<br />
restrições (…). O homem pode ter mais do que uma mulher,<br />
é verdade, só que tem que tratá-las com igualdade, percebes<br />
E isso é muito complicado para uma pessoa normal. E por isso é<br />
que eu acho que, hoje em dia, essa poligamia não é bem possível.<br />
Portanto, se o meu marido futuro quisesse fazer isso... Bom, eu<br />
acho que tentaria explicar-lhe que as coisas não são bem assim<br />
e não aceitaria”. (Yasmin, 19 anos, origem indiana)<br />
Maria Abranches<br />
125