11.01.2015 Views

PERTENÇAS FECHADAS EM ESPAÇOS ABERTOS - Acidi

PERTENÇAS FECHADAS EM ESPAÇOS ABERTOS - Acidi

PERTENÇAS FECHADAS EM ESPAÇOS ABERTOS - Acidi

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />

A tua terra é a tua terra sempre. Se calhar, quando a situação lá<br />

melhorar, gostava de voltar para lá trabalhar, dependendo da<br />

situação. Podemos pensar, mas os nossos filhos, eles não vão<br />

querer voltar, vão gostar de ficar cá, já não dá. Temos que fazer a<br />

coisa que a minha mãe faz. Ela está lá, fica muito tempo fora,<br />

depois vem cá visitar os filhos”. (Aisatu, 23 anos, origem e naturalidade<br />

guineense)<br />

Esta posição intermédia, muito presente em alguns testemunhos de<br />

mulheres guineenses, caracteriza-se pela impossibilidade que estas<br />

mulheres sentem em regressar ao seu país (devido, em grande medida,<br />

à existência de filhos na sociedade receptora, às redes de relações que<br />

entretanto constroem, às dificuldades socioeconómicas do país de origem,<br />

e ainda, no caso das guineenses, por motivos que se ligam à instabilidade<br />

política) e, simultaneamente, ao incontornável desejo (mito) de<br />

regresso, uma espécie de fidelidade à sua história pessoal (Fibbi,<br />

Bolzman e Vial, 2001; Monteiro, 1993).<br />

Pelo contrário, as oito jovens entrevistadas de origem indiana afirmam<br />

não ter qualquer intenção de regressar ou viver no país de origem,<br />

salientando mesmo que em nada se identificam com Moçambique, ou até<br />

com a Índia:<br />

“Já fui três vezes, para aí, sempre de visita, a Moçambique. É, tipo,<br />

um sítio que tu nem sequer identificas nada... Ou tu vais e vês<br />

alguns familiares, ou então não identificas nada com a tua família.<br />

Não tem nada a ver. (...) À Índia nunca fui, e não me identifico.<br />

Muito sinceramente, não. Em termos de cultura, não. Já estive no<br />

Paquistão, e eu e o meu irmão passávamos o dia inteiro no quarto<br />

do hotel, porque a confusão das ruas, as pessoas... Ó pá, não tens<br />

noção, não tem nada a ver, nada, nada, nada. Não gostei, não. Eu<br />

identifico-me muito mais com Portugal”. (Rafiah, 21 anos, origem<br />

indiana, naturalidade portuguesa)<br />

A passagem geográfica das religiões e tradições de uma cultura para<br />

outra significa que novos elementos culturais serão introduzidos, e<br />

nenhuma categoria identitária permanece imutável com a migração. As<br />

tradições culturais e religiosas entram em interacção com o novo<br />

ambiente, produzindo-se mudanças nas interpretações dos símbolos<br />

(Roald, 2001). Estas negociações são, como já vimos, estratégicas e<br />

contextuais, e as mulheres muçulmanas podem, através delas, reinterpretar<br />

o discurso religioso, articulando códigos e práticas tradicionais e<br />

ocidentais, num jogo de “bricolage” (Cardeira da Silva, 1999). Como diz<br />

esta autora, “o investimento das mulheres (...) não é no sentido de<br />

Maria Abranches<br />

63

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!