PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
o chapéu. O gajo vira-se contra mim, deu-me uma cabeçada aqui,<br />
fiquei com um hematoma, fiquei com isto tudo inchado”. (Manar,<br />
25 anos, origem indiana, filha de Leila)<br />
Tal como Manar, a maioria das jovens entrevistadas que considera existir<br />
racismo em Portugal, salienta sobretudo o contexto escolar como lugar<br />
de manifestação de atitudes e práticas discriminatórias:<br />
“É assim, a única coisa assim mais… foi, tipo, quando andava na<br />
secundária, aí acho que foi a única vez que senti, porque me<br />
chamaram monhé. Mas de resto, não”. (Inas, 27 anos, origem<br />
indiana)<br />
“Houve umas coisas que a gente vai levando no dia-a-dia, um<br />
pouco de racismo daqui, o olhar de lado... Não foi aquele sentir<br />
directamente, mas senti algumas vezes na escola. Tinha sempre<br />
aquelas pessoas mazinhas assim que falavam: «Olha, preto, vá<br />
para a sua terra»”. (Kumbá 19 anos, origem guineense)<br />
“Na turma eu sempre fui a única preta (...). Eu sempre me dei bem<br />
com toda a gente, mas, às vezes, é aquela coisa, às vezes a pessoa<br />
sente... Mas isso talvez mais em criança, agora não. Sabes que<br />
agora, se encontro alguém na rua, essa pessoa tem logo<br />
tendência para dizer: «Vai mas é para a tua terra». Já me<br />
disseram muitas vezes. E eu, na altura, só dizia: «Mas a minha<br />
terra é aqui», «Ah, vai para a terra dos teus pais». Pronto, aí já<br />
ficava um bocadinho calada, né No início isso incomodava, mas<br />
depois lá foi passando. Mas nunca senti assim tanto, era só aquele<br />
levezinho”. (Diminga, 25 anos, origem guineense)<br />
Para além das situações salientadas nestes discursos, também os<br />
ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001 em Nova Iorque foram<br />
mencionados como um aspecto causador de um sentimento de<br />
desconforto entre algumas indianas:<br />
“Naquela altura do 11 de Setembro foi quando comecei a<br />
licenciatura, então, as conversas em todas as disciplinas, era só<br />
isso… Os muçulmanos, a burca, os terroristas… Mas há que saber<br />
diferenciar, e foi isto que eu usei na escola para explicar, às vezes,<br />
aos meus professores. É diferente uma pessoa fanática de uma<br />
pessoa normal, como eu. Porque a palavra ‘Islão’ quer dizer paz.<br />
Aquilo não tem nada a ver com o Islão, aquilo é política, aquilo é<br />
loucura. E isso chateou-me um pouco, sabes” (Latifah, 27 anos,<br />
origem indiana)<br />
“Não, graças a Deus não tenho razões de queixa disso. Só quando<br />
começou a haver essa coisa do Bin Laden, mas também eu não fiz<br />
caso disso. Havia pessoas, mesmo esses jovens, quando me viam<br />
Maria Abranches<br />
183