PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
“Sei falar uma língua mesmo de Moçambique, Maputo, que<br />
chama-se maronga. E a língua dos meus pais é manhambane,<br />
que é de Inhambane, que eu falo assim poucochinho. Em Moçambique<br />
falava muito era maronga. Com os meus pais falava muito<br />
português. Com o meu primeiro marido era sempre maronga<br />
e português, ali havia mistura”.<br />
[E em Portugal que língua fala habitualmente]<br />
“Português, porque, por exemplo, o meu marido já é de lá do norte,<br />
portanto, ele não sabe falar a língua de Maputo, maronga ele não<br />
fala. Ele é da Ilha de Moçambique. Portanto, aqui em casa é só<br />
português. Os meus filhos, a língua da mãe, que é maronga, não<br />
sabem, nem a língua do pai, não sabem. Sabem só português”.<br />
(Fatimah, 58 anos, origem indiana, em Portugal desde 1977)<br />
“Com os meus pais falava macua, o nosso dialecto de Moçambique.<br />
De vez em quando português, mas sempre falámos a nossa<br />
língua. Com o meu marido também falava sempre em macua, mas<br />
apesar que os meus filhos não sabem bem falar macua. Sabem<br />
alguns, mas já é outro tempo, né Nem essa minha neta que veio<br />
de Moçambique, não sabe. Minhas netas não sabem macua”.<br />
(Fariah, 68 anos, origem indiana, em Portugal desde 2001)<br />
Estes testemunhos revelam que, apesar da utilização das línguas<br />
moçambicanas no país de origem, a língua portuguesa era igualmente<br />
falada, tal como no caso das mulheres que utilizavam as línguas indianas<br />
em Moçambique. Esse duplo registo linguístico já não acontecia com as<br />
guineenses na Guiné-Bissau. O estatuto social que, como já foi referido, é<br />
um dos elementos que diferencia, regra geral, os dois grupos de mulheres,<br />
detendo a generalidade das indianas um perfil mais privilegiado do<br />
que as guineenses, constitui um factor que influencia as práticas linguísticas<br />
e que se liga à maior ou menor utilização do português na origem.<br />
Esta utilização é, contudo, reforçada em Portugal por umas e por outras,<br />
devido à presença dos filhos e à preocupação com a integração e sucesso<br />
escolar dos mesmos.<br />
Todavia, as línguas étnicas ou o crioulo continuam a ser falados com<br />
maior frequência entre os adultos guineenses, enquanto as indianas se<br />
dividem mais entre a língua de origem e o português. Para a utilização<br />
das línguas tradicionais entre as mais jovens contribui a presença de<br />
familiares mais velhos em Portugal que, sobretudo entre as indianas,<br />
constituem uma fonte de pressão social para a transmissão de símbolos<br />
de identificação cultural e de consolidação do sentimento de pertença ao<br />
grupo de origem, como é o caso da língua. Mais uma vez, entre as<br />
mulheres indianas, verifica-se a divisão entre o desejo de perpetuar as<br />
Maria Abranches<br />
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