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PERTENÇAS FECHADAS EM ESPAÇOS ABERTOS - Acidi

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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />

tra. Não, estou contra. Para os meninos não estou contra porque<br />

é uma questão de limpeza, mas para meninas não. Eu fiz, mas a<br />

minha filha não, nem morta”. (Fulé, 44 anos, origem guineense)<br />

As outras guineenses referem ter conhecimento da luta que está a ser<br />

levada a cabo contra a mutilação genital feminina na Guiné, e estarem<br />

informadas sobre as consequências negativas da prática, sabendo da<br />

urgência com que algumas organizações querem proibi-la 16 . Foi, todavia,<br />

claramente visível a resistência ao abandono de uma prática tão<br />

profundamente enraizada, e o secretismo que a envolve, verificando-se<br />

um baixar de olhos e um encolher de ombros quando se lhes pede uma<br />

opinião acerca dessa possível proibição:<br />

“Não, a minha neta já não vai fazer. Essa já encontrou com tempo<br />

de proibição, já não vai fazer. Mas as africanas quase todas<br />

fizeram, as que nasceram lá. A maioria fizeram, agora é que já<br />

não, agora é que estão a acabar com aquilo. Já houve muitas<br />

cimeiras sobre isso, para acabarem com isso. Para mim é igual”.<br />

(Mariatu, 44 anos, origem guineense, mãe de Diminga)<br />

“Sabe, agora como a ciência desenvolveu, acho que não dá para<br />

continuar a fazer, porque estão a lutar todos os dias para não<br />

fazer agora, porque dizem que quando uma miúda faz isso tem de<br />

perder muito sangue, até pode criar outro problema. É por isso<br />

que agora estão a lutar para deixar de fazer. Mas para nós,<br />

muçulmanos, na Guiné, deixar de fazer isso deve custar muito,<br />

porque é a nossa tradição”. (Kulumba, 40 anos, origem guineense)<br />

“Como eu estou a viver aqui, não sei. Para mim tanto faz. Melhor<br />

não fazer, porque dizem que isso está a acabar, e não-sei-quê. Eu<br />

tenho a minha neta aqui, já tem 12 anos. A minha neta não fez,<br />

não. (...) Para mim dá na mesma. Nós fazíamos antigamente, mas<br />

agora se ninguém faz, para mim tanto faz. A minha filha fez, essas<br />

mulatas que nasceram cá, desse homem, não. Meu marido não<br />

sabe bem disso, mas eu também não queria. Elas já tomaram a<br />

religião do pai, elas bebem, comem carne de porco... Eu não<br />

posso fazer, porque elas nasceram cá, nunca conheceram a<br />

África, não vou levar elas lá só por causa disso. Não, não vou fazer<br />

isso, não quero”. (Musuba, 69 anos, origem guineense)<br />

16. Apesar de, há uns anos, um projecto de lei que proíbe a mutilação genital feminina<br />

ter entrado na Assembleia Nacional Popular da Guiné, este não foi aprovado. No entanto,<br />

algumas ONG guineenses têm vindo a lutar contra a prática. A organização Al-Ansar (que<br />

significa, em árabe, “aqueles que ajudam”), criada em 1992, é a mais antiga destas.<br />

Porém, das 20 ONG que fazem parte do Concelho Nacional Islâmico (CNI), apenas duas<br />

apoiam o combate contra a excisão (Branco, revista Pública, 16/11/2003).<br />

Maria Abranches<br />

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