PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
jovem e a passagem para a família do cônjuge, em que os familiares<br />
mais próximos da noiva se despedem da mesma, um de<br />
cada vez chorando junto desta, cobertos pelo véu vermelho e<br />
verde indiano. Enquanto os pais, irmão, primos e tios aguardam,<br />
em fila, a sua vez de se aproximarem de Zayba para a despedida,<br />
nota-se o peso do momento, que as lágrimas não disfarçam.<br />
A este propósito, as amigas da noiva comentam a crueldade desta<br />
etapa do ritual, que consideram um sofrimento desnecessário<br />
para os familiares e para a própria noiva, considerando que não se<br />
deveria perpetuar. A festa termina com a saída da noiva, ainda<br />
coberta pelo véu”. (Excerto do diário de campo, Agosto de 2003)<br />
Tal como os casamentos que se realizam entre a comunidade indiana, os<br />
casamentos guineenses variam igualmente de acordo com factores como<br />
o estatuto social. A coexistência de símbolos é, do mesmo modo, visível<br />
nesta população, em que uma vez mais predomina o vestido de noiva<br />
branco, característico de sociedades ocidentais, surgindo, assim,<br />
elementos adaptados ao novo quadro de inserção, muitas vezes devido às<br />
dificuldades encontradas numa transposição rigorosa dos ritos tradicionais,<br />
já referidas anteriormente, que também se verificam relativamente<br />
aos rituais de nascimento. Também o prolongamento dos festejos por<br />
vários dias se verifica entre os guineenses, mas, neste caso, essas celebrações<br />
acontecem geralmente na semana que se segue ao casamento<br />
religioso, e não na precedente. O testemunho de Aisatu, que se casou<br />
igualmente pouco tempo após a realização da entrevista, demonstra<br />
ainda a diferença referente à dupla celebração, uma primeira religiosa,<br />
realizada pelo Imam da mesquita, e uma segunda, à qual é atribuída<br />
maior importância, revestida de símbolos tradicionais:<br />
“Vou casar sábado na mesquita. Mas isso eu acho que já não tem<br />
grande diferença com o vosso, porque o vestido vai ser igual, vou<br />
com o véu, vou levar bouquet, a minha sobrinha vai levar a cesta<br />
da aliança... (…) Então, no domingo, é que vai ser mesmo o<br />
casamento muçulmano também. Também vou vestida de branco,<br />
mas é diferente, são panos brancos, tem que ser mesmo coberta.<br />
Essa festa de domingo já não é na mesquita, essa já é na casa da<br />
minha irmã mais velha, vai ser mesmo lá. Porque é assim, no<br />
sábado, quando eu casar, volto para casa do meu irmão, só no<br />
domingo é que eu vou para casa do meu marido, já de vez”.<br />
(Aisatu, 23 anos, origem guineense)<br />
Os panos brancos que cobrem a mulher nesta última ocasião são<br />
referidos pelas guineenses que se casaram no país de origem como parte<br />
da tradição guineense. Corresponde ao ritual festivo de amarramento, o<br />
Maria Abranches<br />
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