PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
fula. Mandinga falo pouco… Por exemplo, agora, com essa<br />
senhora falei mandinga. Algumas pessoas que vêm aqui são<br />
mandingas, falam mandinga e eu falo com elas. (...) Com os meus<br />
filhos é português. Sempre foi, mesmo até agora... Não sei,<br />
habituámos a falar desde criança com eles assim”. (Mariatu, 44<br />
anos, origem guineense, mãe de Diminga)<br />
As restantes guineenses mais velhas falam também português com os<br />
filhos (ou francês, no caso de Fulé, cujos filhos residem em França) e o<br />
crioulo ou a língua étnica de origem com o cônjuge e outros familiares<br />
mais velhos. Mesmo as mulheres de chegada mais recente, que têm<br />
ainda fortes limitações no uso da língua do país de acolhimento,<br />
procuram falar português com os filhos pequenos.<br />
“Na Guiné eu falava crioulo e mandinga. Agora eu falo crioulo, ou<br />
português ou francês. Eu não falo muito mandinga em casa, eu<br />
falo mandinga mais aqui [na mesquita] com as convivências. Mas<br />
os meus filhos não falam, quando os meus filhos vêm a gente só<br />
fala francês. Eles falam crioulo, mandinga não”. (Fulé, 44 anos,<br />
origem guineense, em Portugal desde 1999)<br />
Musuba, há mais tempo em Portugal e casada com um português, representa<br />
uma situação particular em que a língua portuguesa vai sendo<br />
esquecida à medida que os fluxos migratórios provenientes da Guiné vão<br />
aumentando, devido às novas redes de sociabilidade que estabelece, onde<br />
o crioulo é o veículo de comunicação que mais utiliza:<br />
“Na Guiné eu falava a minha língua, beafada. E falava mandinga,<br />
falava crioulo, tudo. Agora é que não sei falar português, mas<br />
antigamente, a partir de 70, 71, 72, eu não sabia falar a minha<br />
língua bem, só português. Mas agora que estão aqui muitos<br />
negros, falam crioulo, e já não sei falar português agora, está a<br />
compreender Aqui em casa falo português só com o meu marido<br />
e com vizinhas, mas saio aqui na rua já estou a falar crioulo. Olha,<br />
agora já não é crioulo nem português, é mistura. Beafada não falo<br />
muito, mas ainda sei falar. É a minha língua, como é que eu vou<br />
perder” (Musuba, 69 anos, origem guineense, em Portugal desde<br />
1968)<br />
Enquanto as línguas de origem representam, para as mulheres mais<br />
velhas, a memória familiar e a preservação do seu passado linguístico e<br />
cultural, para as mais jovens aquelas não têm o mesmo significado<br />
(Quintino, 2004). Contudo, também o tempo de residência contribui para o<br />
maior ou menor valor simbólico atribuído à língua. Fatumata, de apenas<br />
21 anos, mas chegada recentemente a Portugal com a filha pequena,<br />
Maria Abranches<br />
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