PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
conseguem negociar alguma flexibilidade das normas, trata-se<br />
geralmente de uma negociação relativa, na medida em que, muitas<br />
vezes, esta flexibilidade traduz-se num processo cauteloso em que a<br />
atenção é posta na ocultação ao grupo de certos comportamentos,<br />
considerados desviantes face às normas instituídas. Pelo contrário,<br />
entre as guineenses não se encontra a mesma necessidade de circunscrever<br />
as práticas socioculturais ao que é determinado pelo grupo. Para<br />
isso contribuirão as especificidades já referidas, que cruzam, neste<br />
grupo, diferentes heranças culturais, bem como a heterogeneidade que<br />
caracteriza os guineenses em geral, cujas redes de relacionamento com<br />
diferentes etnias se estabelecem ainda no próprio país de origem.<br />
Deste modo, apesar de as jovens indianas conhecerem formas de socialização<br />
externa, e não ignorando as diferenças sociais que se encontram<br />
no seio deste grupo, nem as diferenças de interpretação do Islão e de<br />
vivência religiosa, é com pouca reserva que podemos afirmar que<br />
estamos, neste caso, perante uma comunidade, o que já não é verdade<br />
para as guineenses. O Islão popular e tranquilo, definido por Lamchichi e<br />
Cesari como a forma de adaptação mais comum entre os muçulmanos de<br />
residência mais antiga em França (ver capítulo 2) é, de facto, transponível<br />
para os elementos mais velhos da população de origem indiana em<br />
Portugal, em que o objectivo principal da comunidade consiste precisamente<br />
em transmitir as normas e valores de origem aos mais jovens,<br />
estabelecendo formas de coesão.<br />
Dizendo isto, não se pretende, todavia, afirmar que não há comunicação<br />
entre esta população e outros grupos. Pelo contrário, procura-se aqui<br />
salientar algumas limitações que determinadas perspectivas demonstram,<br />
ao sobrevalorizarem a diversidade étnica face a outros elementos<br />
de diferenciação inerentes a cada grupo, e ao atribuírem-lhe fronteiras<br />
impossíveis de alterar, mesmo quando dentro dessas fronteiras actuam<br />
factores de discriminação fortes.<br />
De facto, perspectivas reducionistas sobre as identidades também se encontram<br />
na análise das identidades étnicas. A abordagem multiculturalista, por<br />
exemplo, enfatizando a crescente diferenciação cultural das sociedades, por<br />
via da entrada de populações migrantes de proveniências diversas, acaba por<br />
entender essas populações como culturalmente estanques e não comunicantes<br />
entre si. Cada minoria étnica é vista como socialmente homogénea e<br />
com fronteiras bem definidas, sendo sobrevalorizada a diversidade étnica e<br />
ignorados outros factores como a classe social, género ou religião, que contribuem<br />
igualmente para a construção das identidades e introduzem<br />
diferenças de valores e estilos de vida (Machado, 2002).<br />
Maria Abranches<br />
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