PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
aí, se calhar. O meu primeiro amor, e aquela coisa toda, era<br />
caboverdiano. A minha mãe sabia, a minha mãe sabe tudo, o meu<br />
pai nunca sabe muito. O meu pai percebe sempre, mas ele faz que<br />
não percebe. Mas pronto, ele sabia, mas nunca proibiu. (Kumbá,<br />
19 anos, origem guineense, namora com um guineense de outra<br />
etnia, não muçulmano)<br />
Ambas salientam, contudo, o conflito que se instalaria entre elas e os pais<br />
se pretendessem casar com um não muçulmano. Embora elas próprias<br />
não atribuam importância à origem religiosa do parceiro, a pressão<br />
familiar e social sentida leva-as a desejar o casamento intra-religioso, de<br />
forma a evitar tensões familiares:<br />
“Isso da religião é uma coisa, assim, que para nós é indiferente,<br />
não interfere directamente para nós. Mas eu tenho a perfeita<br />
noção de que isso é quase que impossível. Influencia um bocadinho<br />
a religião, da parte dos meus pais, principalmente do meu pai,<br />
e da parte dos pais dele. Temos aquela coisa que é praticamente<br />
impossível. Claro que vai ter muitos problemas se eu um dia<br />
decidisse me casar com ele, e vai ser da parte do meu pai. A<br />
minha mãe não, ela diz: «Queres-te casar com ele, casas com ele.<br />
Gostas dele, ele gosta de ti, isso para mim é o que mais importa».<br />
Eu, sinceramente, pedia muito a Deus que casasse com uma<br />
pessoa que fosse da minha religião. Para já, não tinha que<br />
arranjar problemas com os meus pais, era um casamento aceite<br />
por todos, era uma pessoa que conhecia a minha religião e que,<br />
pronto, que me compreendia, e eu compreendia a pessoa”.<br />
(Kumbá, 19 anos, origem guineense)<br />
“Eu gostava de encontrar alguém com a mesma religião que eu e,<br />
de preferência, não por mim, mas por respeito aos meus pais e à<br />
comunidade onde eu vivo. Por respeito, não por causa deles, mas<br />
por causa do impacto que isso tem na minha família, porque eu<br />
não concordo, mas é pelo impacto que tem na minha família”.<br />
(Rafiah, 21 anos, origem indiana)<br />
Os testemunhos da maioria das outras jovens vão no mesmo sentido. De<br />
facto, se alguns factores de controlo das jovens são mais visíveis entre as<br />
indianas, quando se trata do casamento, a pressão para o fechamento<br />
intra-étnico é comum a ambas as populações, o que evidencia um maior<br />
controlo social na dimensão familiar das sociabilidades:<br />
“Eu quando pedia a Deus... Quando rezava, pedia sempre que eu<br />
encontrasse uma pessoa que seja da mesma religião, que eu<br />
amasse uma pessoa da mesma religião que eu, porque eu sabia<br />
que só assim... Há uma coisa que uma pessoa evita, evita mesmo,<br />
Maria Abranches<br />
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