11.01.2015 Views

PERTENÇAS FECHADAS EM ESPAÇOS ABERTOS - Acidi

PERTENÇAS FECHADAS EM ESPAÇOS ABERTOS - Acidi

PERTENÇAS FECHADAS EM ESPAÇOS ABERTOS - Acidi

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />

lá, não verem as mulheres. É assim lá, era assim, vivíamos<br />

assim”. (Leila, 67 anos, origem indiana)<br />

Sendo a mulher tradicionalmente destinada a permanecer no espaço<br />

privado e cabendo ao homem o domínio do espaço público, quando ela sai<br />

dos limites desse espaço deve ter, de acordo com a religião, alguns<br />

cuidados. Mais uma vez, as normas religiosas centram-se no corpo<br />

feminino que, por estimular a desordem, como já vimos, deve ser objecto<br />

de imposição de regras. As questões ligadas ao uso do véu, tratadas no<br />

capítulo 2, adquirem, na separação entre espaço público e privado, a<br />

maior importância. Contudo, a adaptação ao novo meio após a migração<br />

leva grande parte destas mulheres a reinterpretarem também aqui o<br />

discurso religioso. Embora se saiba que uma pequena facção das<br />

muçulmanas em Portugal, mais tradicionalistas, se cobrem com o nikab 30<br />

(as “ninjas” de que falava Nisa a propósito da comunidade residente no<br />

Laranjeiro), as indianas mais velhas entrevistadas nem sempre usam o<br />

véu no espaço público e, para as que usam, trata-se de um lenço que<br />

cobre apenas o cabelo. As guineenses, por sua vez, inserem-se num<br />

registo de tradições diferentes, já que o lenço que usam é de origem<br />

africana e, como também já foi explicitado, amarra-se no alto da cabeça<br />

e não cobre todo o cabelo. Falar de um vestuário muçulmano tradicional<br />

é efectivamente complicado, na medida em que as vestes indianas<br />

e guineenses são totalmente distintas, podendo, portanto, falar-se de<br />

vestuário indiano e guineense, com características particulares:<br />

“Lá está, o que é que é típico muçulmano É assim, as nossas<br />

roupas são indianas, mas lá está, aquilo não é o traje muçulmano.<br />

O que é um traje muçulmano É o cabelo tapado... Quando vais<br />

para Meca, por exemplo, tens que andar... Quando rezas não<br />

podes ter os braços à mostra, tens de estar de calças e tapas o<br />

cabelo”. (Nisa, 24 anos, origem indiana)<br />

Neste testemunho de Nisa é possível observar que o vestuário tradicional<br />

e o lenço são, para as indianas mais novas, apenas utilizados em locais<br />

sagrados e no momento das orações. A preocupação que por vezes surge<br />

com alguns elementos da indumentária, como saias mais curtas ou<br />

blusas mais apertadas, deve-se, por seu lado, ao controlo social. De facto,<br />

essa preocupação é visível sobretudo quando se verifica a presença de<br />

outros muçulmanos, desaparecendo em situações que envolvem apenas<br />

pessoas de origem portuguesa. Tal como o controlo da sexualidade das<br />

raparigas, também a forma como estas se apresentam no espaço público<br />

30. Véu que cobre o rosto e a testa, deixando apenas os olhos a descoberto.<br />

Maria Abranches<br />

164

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!