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PERTENÇAS FECHADAS EM ESPAÇOS ABERTOS - Acidi

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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />

Mas são as sociabilidades ligadas às relações de amizade que conhecem<br />

maior flexibilização, podendo estas relações ser construídas, embora de<br />

forma restrita, para fora das fronteiras da população co-étnica. São<br />

novamente as mães que, dentro da família, aceitam, por vezes, amizades<br />

do sexo masculino ou exteriores ao grupo étnico estabelecidas pelas<br />

filhas, com a condição de que estas se afastem dos espaços frequentados<br />

e controlados pelos co-étnicos, para que não sejam vistas pelos outros<br />

membros do grupo. Esta necessidade de negociar as redes de amizade<br />

caracteriza em particular as famílias de origem indiana, na medida em<br />

que o controlo familiar e social entre as guineenses é, como já foi<br />

referido, menos marcante.<br />

A configuração das sociabilidades liga-se, nestas mulheres, a contrastes<br />

culturais fortes com a população portuguesa. Estamos, portanto, perante<br />

uma situação de fechamento relacional, mas diferenciado entre as<br />

mulheres de ambos os grupos e entre os dois tipos de sociabilidades, ou<br />

seja, mais marcante, em geral, entre as indianas e, em particular, no que<br />

diz respeito às redes de sociabilidade familiar – estas, mais fechadas quer<br />

entre indianas, quer entre guineenses, na medida em que os casamentos<br />

são predominantemente intra-étnicos.<br />

É importante não esquecer, porém, que as amizades que algumas destas<br />

jovens criam com pessoas de origem portuguesa também produzem<br />

continuidades, no espaço da etnicidade (Machado, 2002), com a população<br />

autóctone. Aqui, o que mais diferencia os dois grupos é a forma como<br />

essas amizades são controladas pela família, não podendo, por vezes,<br />

entre as jovens indianas, ser expostas perante o próprio grupo de pertença.<br />

Também as formas de lazer associadas às redes de amizade são<br />

negociadas, passando essa negociação, muitas vezes, por escondê-las do<br />

olhar dos co-étnicos. Assim, tal como algumas destas jovens são autorizadas<br />

a sair com amigos exteriores ao grupo, apenas se tiverem o<br />

cuidado de não serem vistas, também a frequência de discotecas ou<br />

mesmo a utilização de vestuário considerado menos apropriado são<br />

situações que devem ser mantidas longe do olhar do grupo, por serem<br />

encaradas como prejudiciais para a honra da família.<br />

As normas e valores tradicionais que se associam, neste caso, a uma<br />

religiosidade forte, são, assim, negociados por estas mulheres, de acordo<br />

com estratégias próprias, sendo a religião também reinterpretada com<br />

frequência. A própria flexibilidade do Islão torna os capitais simbólicos<br />

cambiáveis, sendo os valores tradicionais adaptados e transformados,<br />

influenciados por novas referências que se cruzam de forma dinâmica<br />

(Bourdieu, 1979; Cardeira da Silva, 1999). Os valores tradicionais, locais e<br />

Maria Abranches<br />

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