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PERTENÇAS FECHADAS EM ESPAÇOS ABERTOS - Acidi

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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />

Confirma-se, portanto, mais uma vez, a influência de vários elementos na<br />

(re)construção da identidade das mulheres muçulmanas e das suas<br />

filhas. Tal como já tínhamos visto, as segundas são, de resto, um veículo<br />

de alteração da posição subordinada que as primeiras tradicionalmente<br />

ocupam nos respectivos países de origem. Sendo a relação entre os sexos<br />

no espaço social muçulmano codificada quer pelas referências religiosas,<br />

quer pelas tradições locais, também na definição dos códigos de conduta<br />

relativos à sexualidade da mulher, religião e tradição desempenham um<br />

papel fundamental. O papel da tradição não é difícil de identificar se<br />

pensarmos, por exemplo, na importância que se atribui à virgindade em<br />

pequenos meios rurais de países como Itália ou Portugal, de maioria<br />

católica. Todavia, embora também nesses países seja um costume<br />

revestido de uma dimensão religiosa, em contexto muçulmano a<br />

virgindade feminina associa-se à família, significando a continuidade de<br />

um sistema cultural onde toda a família está implicada, na medida em<br />

que prova a pureza dos valores e a religiosidade da mesma (Zemmour,<br />

2002).<br />

O facto de ser a sexualidade feminina a constituir objecto de controlo<br />

reafirma o poder masculino sobre a mulher, sendo esta considerada<br />

como perturbadora dos valores morais através da sensualidade que<br />

exibe. No entanto, na concepção islâmica, a sexualidade dentro do<br />

casamento passa a ser aceite e extremamente livre, tal como é aceite a<br />

utilização de métodos contraceptivos (Zemmour, 2002). A sexualidade<br />

feminina deixa, então, de ser controlada, uma vez que foi alcançada a<br />

principal fase da vida: o casamento.<br />

É, portanto, apenas durante o período de preparação para o casamento<br />

que a virgindade feminina se torna um valor sagrado, que se liga<br />

essencialmente à preservação da honra e do prestígio da família. Muitas<br />

vezes, nos países de origem, os pais das jovens, conscientes do estatuto<br />

social que esse valor representa, tendem a casar cedo as suas filhas para<br />

garantir a preservação da virgindade. A este propósito, Mariatu revela<br />

ainda uma outra forma de controlo pela qual passou na Guiné-Bissau:<br />

“Nós lá era assim... Na altura, quando já sabem que uma miúda<br />

já está crescida, está na altura do casamento, os pais, como têm<br />

medo que a pessoa vá se entregar de outra maneira qualquer<br />

assim, já têm a pessoa com quem eles querem que a filha case, e<br />

eles fazem para que ela se entregue logo à pessoa. Eles fazem<br />

isso que é para não poder perder a virgindade com outras pessoas,<br />

não é Comigo foi assim, foi a minha tia mesmo”. (Mariatu,<br />

44 anos, origem guineense)<br />

Maria Abranches<br />

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