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Introdução<br />
Apesar do uso abrangente da denominação língua materna (ale. Muttersprache,<br />
ing. mother tongue), tem-se feito uma série de críticas a ela 2 principalmente devido à<br />
sua imprecisão e às variações de sentido observadas no seu uso. A seguir, pretendese<br />
analisar os problemas ou implicações que o conceito acarreta quando aplicado a<br />
contextos multilíngües, 3 como é o caso de boa parte das comunidades de descendentes<br />
de imigrantes europeus no sul do Brasil enfocadas por nossas pesquisas.<br />
De modo geral, pode-se dizer que, mesmo uma conceituação mais ou menos<br />
razoável, como a que define língua materna como “a primeira língua aprendida no<br />
lar”, 4 não simplifica de modo algum a questão, que se mostra ainda mais complexa<br />
do que se pode supor a priori. Tal complexidade ultrapassa o plano meramente<br />
lingüístico, para abranger adicionalmente aspectos de ordem histórica, social, política,<br />
educacional e psicológica, como tentarei mostrar a seguir. Pensando, por<br />
exemplo, em um falante bilíngüe que, como eu, adquiriu simultaneamente duas<br />
línguas, o Hunsrückisch e o português, poderíamos perguntar: esse falante possui<br />
duas línguas maternas? 5 O que implica o conceito de língua materna? E como<br />
solucionar os diversos problemas inerentes a sua definição?<br />
Problema 1: a versão oficial<br />
dos censos demográficos<br />
Um primeiro exemplo que serve para ilustrar as oscilações de sentido da denominação<br />
língua materna é dado pelos censos demográficos no Canadá, portanto um<br />
país eminentemente multilíngüe que abriga duas grandes línguas nacionais, o inglês<br />
e o francês. Como observa Romaine (1994, p. 37), até 1941 a mother tongue aparece<br />
nesses censos como sendo “a primeira língua aprendida pelo respondente e ainda<br />
falada [grifo nosso]”. De 1941 até depois de 1976, contudo, passa-se a uma definição<br />
de “primeira língua aprendida e ainda compreendida [grifo nosso]”. A mu-<br />
2. Vejam-se Apeltauer (1997, p. 10) e Romaine (1994, p. 37).<br />
3. Cf. Crystal (1997, p. 289): “In many of the more multilingual communities in the world, it is<br />
not even easy to answer the simple question, ‘What is your mother tongue?’”.<br />
4. Weinreich (1974, p. 88): “Notwithstanding the reservations about the term ‘mother tongue’<br />
when applied vaguely [...], the expression can be utilized in the present technical sense as<br />
‘the language learned first’”.<br />
5. Sobre a língua materna do indivíduo bilíngüe, vejam-se dificuldades em Kielhöfer & Jonekeit<br />
(1983, p. 19), que concluem pela pouca utilidade do conceito Muttersprache (“in seiner<br />
Irrationalität wenig hilfreich”).