Oliveira, Paula Felipe Schlemper de - UFSC
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pseudoneutralida<strong>de</strong> do ensino, o entendimento <strong>de</strong> leitura e escrita como<br />
sistemas in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes e fechados em si mesmos e a supervalorização<br />
da escola no processo <strong>de</strong> ‘aquisição’ <strong>de</strong> ‘altos níveis <strong>de</strong> letramento’. Isso<br />
significa dizer, em alguma medida, que tal mo<strong>de</strong>lo ten<strong>de</strong> a reproduzir a<br />
cultura <strong>de</strong> grupos dominantes.<br />
Sob essa perspectiva, o mo<strong>de</strong>lo autônomo contribui para a<br />
propagação do i<strong>de</strong>ário <strong>de</strong> que há uma única forma do letramento a ser<br />
<strong>de</strong>senvolvido, ou seja, que os sujeitos, quer sejam crianças ou adultos,<br />
construiriam seu processo <strong>de</strong> aprendizagem <strong>de</strong> leitura e escrita da<br />
mesma forma em todos os contextos. Para Kleiman (2001 [1995], p. 22),<br />
“[...] a característica <strong>de</strong> ‘autonomia’ refere-se ao fato <strong>de</strong> que a escrita<br />
seria, nesse mo<strong>de</strong>lo, um artefato completo em si mesmo, com<br />
consistência interna”. Isso significa dizer que, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente dos<br />
letramentos locais, a aprendizagem se daria segundo um mesmo mo<strong>de</strong>lo,<br />
caminho, processo. Estão ligadas a esse mo<strong>de</strong>lo, assim, teorizações que<br />
relacionam, em uma perspectiva causal – polemizada por Graff (1994) e<br />
discutida por Britto (2003; 2005) –, alfabetização com questões como<br />
ascensão econômica e maior mobilida<strong>de</strong> social 61 , o que discutiremos à<br />
frente nesta pesquisa.<br />
Street (1984; 2003) afirma que letramento, tomado à luz do<br />
mo<strong>de</strong>lo autônomo, é concebido como uma habilida<strong>de</strong> técnica, ou seja,<br />
“[...] as pessoas precisam apren<strong>de</strong>r uma forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>codificar as letras, e<br />
<strong>de</strong>pois po<strong>de</strong>rão fazer o que <strong>de</strong>sejarem com o recém-adquirido<br />
letramento” (STREET, 2003, p. 4). Dessa forma, o mo<strong>de</strong>lo autônomo se<br />
erige a partir da compreensão <strong>de</strong> que, em si mesmo, o letramento trará<br />
efeitos sobre outras práticas sociais e cognitivas e, ainda, ten<strong>de</strong> a<br />
apregoar neutralida<strong>de</strong> e universalida<strong>de</strong> que seriam constitutivas do<br />
processo <strong>de</strong> ‘aquisição’ do letramento (STREET, 2003), no entanto “[...]<br />
the 'autonomous' mo<strong>de</strong>l is […] constructed for a specific political<br />
purpose” 62 (STREET, 1984, p. 19).<br />
Já no que diz respeito ao mo<strong>de</strong>lo i<strong>de</strong>ológico <strong>de</strong> letramento,<br />
segundo Street (1984), escrita e leitura são vinculadas às práticas<br />
sociais. Assim, em se tratando dos materiais escritos, importa não<br />
apenas o conteúdo e a situação <strong>de</strong> comunicação no qual são produzidos,<br />
mas valores, i<strong>de</strong>ologias e representações presentes. Para Baltar (2010, p.<br />
216), o letramento i<strong>de</strong>ológico consi<strong>de</strong>ra “[...] o processo histórico,<br />
61 Sobre a questão da mobilida<strong>de</strong> social, ascensão, po<strong>de</strong>r que seriam ‘adquiridos’ juntamente<br />
com o letramento, afirma Street (2003, p. 10) “[...] ‘fornecer’ esse tipo <strong>de</strong> letramento<br />
formalizado não levará à atribuição <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, não facilitará novos empregos, e não gerará<br />
mobilida<strong>de</strong> social”.<br />
62 O mo<strong>de</strong>lo ‘autônomo’ é [...] construído para um propósito político específico.<br />
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