Oliveira, Paula Felipe Schlemper de - UFSC
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A <strong>de</strong>speito do discurso incorporado pelo senso comum e<br />
perpetuado em iniciativas <strong>de</strong> alfabetização massiva, que <strong>de</strong>lega à<br />
alfabetização a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inclusão mais efetiva do sujeito em<br />
socieda<strong>de</strong>s urbano-industriais, a escrita não raro atua nessas socieda<strong>de</strong>s<br />
como um mecanismo <strong>de</strong> exclusão social. O papel social da leitura e da<br />
escrita, em muitos contextos, tem sido fator <strong>de</strong> exclusão, uma barreira<br />
para o acesso à escola (KLEIMAN, 2001a).<br />
Muito mais po<strong>de</strong>rosa do que as barreiras que<br />
impe<strong>de</strong>m o acesso físico <strong>de</strong> alunos, a escrita<br />
constituiu-se, ao longo da história, em instrumento<br />
<strong>de</strong> autoritarismo, opressão e manutenção das<br />
profundas diferenças sociais da socieda<strong>de</strong> brasileira<br />
em vez <strong>de</strong> constituírem instrumento <strong>de</strong> liberação e<br />
emancipação na construção da escola sonhada.<br />
(KLEIMAN, 2001a, p. 85)<br />
Convergente a essa afirmação, Gramsci (1971) pontua que o<br />
primeiro momento da escolarização (o processo <strong>de</strong> alfabetização) é<br />
historicamente marcado pela solidificação da hierarquia social, pela<br />
capacitação das elites e pelo movimento <strong>de</strong> manutenção/aceitação por<br />
parte das pessoas das camadas mais baixas do seio social dos valores,<br />
normas e crenças da elite. E, nesse movimento empreendido no processo<br />
<strong>de</strong> escolarização, a escrita tem importante papel.<br />
Kleiman (2001a) afirma que a escrita exclui, também, <strong>de</strong>vido<br />
aos mitos a ela associados. A exclusão promovida pela escrita ocorre<br />
porque, mesmo diante <strong>de</strong> questionamentos acerca da i<strong>de</strong>ologização da<br />
modalida<strong>de</strong> escrita da língua, como os propostos por Graff (1994), a<br />
escola permanece com uma visão i<strong>de</strong>ologizada e naturalizada <strong>de</strong>ssa<br />
modalida<strong>de</strong> e não como uma tecnologia social (GALVÃO; DI PIERRO,<br />
2007), o que converge com reflexões <strong>de</strong> Street (1984) sobre mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong><br />
letramento registradas nesta pesquisa.<br />
A partir <strong>de</strong>ssas visões estigmatizadas/i<strong>de</strong>ologizadas da escrita<br />
em socieda<strong>de</strong>s grafocêntricas, “[...] o termo analfabeto significa [passa a<br />
significar] outras coisas além <strong>de</strong> ‘não saber ler e escrever’; é um<br />
qualificativo fortemente estigmatizante que carrega outros sentidos<br />
como ‘ignorância’, ‘burrice’, ‘chaga’, ‘cegueira’, e<br />
‘sub<strong>de</strong>senvolvimento’” (RIBEIRO, 2004, p. 10), questão <strong>de</strong> que<br />
tratamos no capítulo imediatamente anterior. Assim, a pessoa adulta não<br />
alfabetizada passa a se sentir não vítima <strong>de</strong> um construto social que a<br />
impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> participar ativamente <strong>de</strong> contextos em que o uso da escrita é<br />
requerido largamente, mas como responsável/incapaz/inábil pela/diante