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imagens de brasilidade nas canções de câmara de lorenzo fernandez

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A canção é sucessão <strong>de</strong> palavras sonorizadas no tempo, materializadas,<br />

presentificadas, corporificadas na voz que entoa. As palavras do poema, visões mentais,<br />

projetam-se no tempo e no espaço impulsionadas pelo sopro, enlaçadas nos sons dos<br />

instrumentos nos quais se apoiam, se fun<strong>de</strong>m, dialogam, complementam.<br />

Vimos que a música é movimento sonoro que ocorre no tempo. A sucessão <strong>de</strong><br />

sons e silêncio, a disposição das notas, as repetições, as progressões harmônicas, as escalas<br />

ascen<strong>de</strong>ntes ou <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes criam movimento. Movimentos são evocativos <strong>de</strong> padrões<br />

experienciados pelo corpo. Pronunciemos as palavras a sauda<strong>de</strong>. Dois tempos fracos e um<br />

acento. Sobre esse ritmo se origina um motivo <strong>de</strong> impulso anacrústico, a partir do qual a<br />

canção A sauda<strong>de</strong> é construída. Esse motivo é reiterado incessantemente ao longo da<br />

canção, na linha do piano, <strong>de</strong>senvolvendo-se algumas vezes em peque<strong>nas</strong> progressões<br />

ascen<strong>de</strong>ntes e diluindo-se nos seis últimos compassos. É como se a melodia no<br />

acompanhamento repetisse à exaustão a sauda<strong>de</strong>, a sauda<strong>de</strong>, a sauda<strong>de</strong>, e, posteriormente,<br />

como um eco, repetisse também a chorar, a chorar, a chorar. A imagem <strong>de</strong>sses<br />

sentimentos e atitu<strong>de</strong>s não se fixa ape<strong>nas</strong> nos nomes que os evocam, mas se prolonga no<br />

tempo, se fixa na memória por uma relação quase que <strong>de</strong> predicação, realizada pela<br />

música. O movimento é espasmódico, repetitivo, guardando sempre peque<strong>nas</strong> variações,<br />

pequenos <strong>de</strong>senvolvimentos em progressões cada vez maiores. A repetição, ao mesmo<br />

tempo em que prevê o retorno, promove a expectativa do que existe por vir. Paralisa o<br />

tempo, cristaliza um instante potencializando-o, intensificando-o, ao mesmo tempo em que<br />

o impele sempre em frente. (Exemplo 1).<br />

A imagem torna-se novamente estática quando nos atemos à harmonia. Nos<br />

primeiros 18 compassos da canção, temos uma harmonia na qual predominam acor<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

sétima da dominante com quinta diminuta, configurando uma harmonia suspensa. Esta<br />

harmonia proporciona uma in<strong>de</strong>finição tonal <strong>de</strong>vido à ambiguida<strong>de</strong> dos acor<strong>de</strong>s, que<br />

po<strong>de</strong>riam se resolver em diferentes tonalida<strong>de</strong>s. Para nossos ouvidos acostumados com os<br />

padrões musicais da música oci<strong>de</strong>ntal, a harmonia suspensa significa uma harmonia que<br />

não encontra resolução numa tônica. Na verda<strong>de</strong>, não existe uma tônica na qual os acor<strong>de</strong>s<br />

po<strong>de</strong>riam se resolver, mas muitas tônicas, isto é, um acor<strong>de</strong> po<strong>de</strong>ria se resolver em<br />

diferentes tonalida<strong>de</strong>s. Devido a essa in<strong>de</strong>finição, a harmonia torna-se estática. Entretanto,<br />

os acor<strong>de</strong>s dissonantes em enca<strong>de</strong>amentos circulares sem resolução nos apontam para uma<br />

estaticida<strong>de</strong> em que a tensão se torna elemento constante. (Exemplo 1). Acostumados com<br />

o direcionamento harmônico que predominou na música dos últimos três séculos,

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