DA EVISTA CADEMIA INEIRA ETRAS - Academia Mineira de Letras
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Imagens: realida<strong>de</strong> e ficção ____________________________________________________ Paulo Augusto Gomes 129<br />
fazem parte da vida dos meus personagens? Não fazem parte das vidas <strong>de</strong><br />
todos nós? Ora, ao promover um recorte da realida<strong>de</strong>, o artista, por<br />
<strong>de</strong>finição, altera essa realida<strong>de</strong>; po<strong>de</strong> até mesmo passar a impressão <strong>de</strong><br />
que o cotidiano <strong>de</strong> alguém tem um dinamismo que, na verda<strong>de</strong>, não está<br />
lá.<br />
Não existe, por conseguinte, “a vida como ela é”. Como é a vida?<br />
Quem sabe? Existe, sim, “a vida tal como eu a vejo” – e é tudo. Toda<br />
criação artística é uma apropriação limitada, redutora, <strong>de</strong>sse fenômeno<br />
complexo a que se chama vida. Nenhuma esgota o tema, nenhuma jamais<br />
conseguirá isso. É essa a razão pela qual é inútil tentar ser abrangente e<br />
universal. Tomando o caminho inverso, ou seja, assumindo o regionalismo<br />
e a visão concentradora, teremos mais chances <strong>de</strong> ser universais e<br />
completos. A que se <strong>de</strong>ve isso? Com licença do lugar-comum, ao fato <strong>de</strong><br />
que o universo está todo contido em um grão <strong>de</strong> areia.<br />
Obras <strong>de</strong> arte são representações – não reproduções. É impossível<br />
reproduzir a natureza com papel e caneta, pincéis e tintas ou câmera e<br />
filme virgem. Temos imagens, apenas, que muitas vezes <strong>de</strong>spertam<br />
emoções e sentimentos diversificados naqueles que as veem. Tentar<br />
explicar a vida e suas manifestações é dos esforços mais inúteis que se<br />
conhecem. Há que senti-la e vivê-la; aí, a obra <strong>de</strong> arte adquire sentido e<br />
significado, como testemunho, no tempo e no espaço, <strong>de</strong>ssa vida vivida.<br />
É conhecida a anedota (ou fato real?) segundo a qual soldados<br />
alemães encontraram-se com Pablo Picasso diante do quadro Guernica,<br />
visão do artista da cida<strong>de</strong> espanhola arrasada pela aviação alemã no<br />
tempo da Guerra Civil. O oficial nazista perguntou ao pintor: “Foi o<br />
senhor que fez isso?”, ouvindo a resposta: “Não, foram os senhores”.<br />
Picasso assume, para si, o papel <strong>de</strong> antena da raça, para usar a expressão<br />
<strong>de</strong> Ezra Pound. Apenas representa, por meio <strong>de</strong> sua arte, uma tragédia <strong>de</strong><br />
proporções gigantescas. E Guernica nem ao menos é uma representação<br />
realista <strong>de</strong>ssa tragédia, com explosões e corpos espalhados. Picasso não<br />
“mostra”, não “documenta” a tragédia, apenas a recria conforme a sentiu.<br />
Isso, aliado ao seu talento próprio, faz com que a tela se apresente como<br />
um testemunho vigoroso do caos que se abateu sobre o mundo àquela<br />
época.<br />
Revista Volume LI.p65 129<br />
12/5/2009, 15:29