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Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...

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velho e seu maior anseio é partir e <strong>de</strong>scobrir se “lá fora os outros são assim <strong>da</strong><br />

mesma cor” que ele (NASCIMENTO, 1961:35). O pai aconselha:<br />

117<br />

Dia virá em que você po<strong>de</strong>rá partir. Mas até lá, até que a barba lhe<br />

cresça e a experiência lhe endureça o coração, fuja <strong>de</strong>sses<br />

pensamentos, pois é através <strong>de</strong>le que o diabo se insinua em nossa<br />

alma. (NASCIMENTO, 1961: 35)<br />

Na seqüência, saem Manassés e o Pai e entra Selene, a irmã mais<br />

nova. Na conversa entre ela e Assur, aprofun<strong>da</strong>-se o <strong>de</strong>scontentamento do<br />

jovem, que revela não conseguir encontrar um sentido para sua vi<strong>da</strong> já que não<br />

gosta <strong>de</strong> arar a terra como o irmão mais velho nem <strong>de</strong> cui<strong>da</strong>r dos rebanhos<br />

como Moab, o mais novo. Nas alternativas <strong>de</strong> futuro que se <strong>de</strong>sdobram para<br />

ele, não encontra a felici<strong>da</strong><strong>de</strong> que i<strong>de</strong>aliza.<br />

Nesse ponto do <strong>de</strong>sabafo, entra Aíla, esposa <strong>de</strong> Manassés, e a<br />

conversa volta a girar sobre os peregrinos que passam na estra<strong>da</strong>. No diálogo<br />

que se segue entre os cunhados, revela-se o outro ponto <strong>de</strong> tensão do drama:<br />

ASSUR: Mas você, Aíla, quantas vezes <strong>por</strong> dia fita poeira no fundo<br />

do horizonte?<br />

AÍLA: (sur<strong>da</strong>mente, junto <strong>de</strong>la Assur) E você, <strong>por</strong> que me espia?<br />

On<strong>de</strong> vou, sinto sua sombra atrás <strong>de</strong> mim.<br />

ASSUR: Nem sei <strong>por</strong>que a sigo, talvez seja <strong>por</strong>que estejamos<br />

sempre olhando a mesma paisagem.<br />

A proximi<strong>da</strong><strong>de</strong> entre os cunhados seguirá tensa nas comparações que<br />

Assur tece entre ele e o irmão, a cunha<strong>da</strong> e a terra, to<strong>da</strong>s <strong>de</strong>preciativas:<br />

ASSUR: (veemente, <strong>da</strong>ndo-lhe as costas) Você bem sabe, Aíla, você<br />

bem sabe! Ele é ain<strong>da</strong> mais escuro que eu, parece uma raiz <strong>da</strong> terra.<br />

AÍLA: Mas seu corpo é quente e é bom estar junto <strong>de</strong>le.<br />

ASSUR: Porque você também é ru<strong>de</strong>. Ambos sugam a vi<strong>da</strong> <strong>de</strong>sta<br />

terra morna e avara. (NASCIMENTO, 1961:38)<br />

Nesse momento, chega um peregrino que, como <strong>de</strong> costume, é bem-<br />

vindo à casa. Enquanto Aíla vai recebê-lo, Selene repreen<strong>de</strong> o irmão <strong>por</strong> tê-la<br />

chamado <strong>de</strong> grosseira e diz que as roupas <strong>da</strong> cunha<strong>da</strong> são melhores que as<br />

que ela mesma usa e seus cabelos, perfumados. Num <strong>de</strong>sdém <strong>de</strong> ciúme, ele<br />

diz: “Que adianta ela perfumar os cabelos? À noite <strong>de</strong>ita-se com um homem<br />

que cheira a estrume” (NASCIMENTO, 1961: 38).

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