Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...
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um passado e um presente divorciado do futuro. (CANDIDO,<br />
1992:61)<br />
Os protagonistas cardosianos se caracterizam pela inconformação, pelo<br />
ressentimento nascido <strong>da</strong> impotência <strong>de</strong> quem se reconhece sem saí<strong>da</strong> e, <strong>por</strong><br />
isso, se <strong>de</strong>sespera. Como já constataram a insignificância <strong>de</strong> tudo o que os<br />
cerca e que compõe aquilo a que os <strong>de</strong>mais chamam <strong>de</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, sobra-lhe<br />
buscar um sentido em si mesmos:<br />
... existe sobretudo a exploração radical do próprio eu, o<br />
<strong>de</strong>sbragamento <strong>da</strong> aventura interior, que leva ao <strong>de</strong>sbragamento <strong>da</strong><br />
conduta, concebi<strong>da</strong> como uma expansão suprema do próprio eu, em<br />
busca <strong>de</strong> si. (CANDIDO, 1992: 113)<br />
Daí suas personagens se caracterizarem pelo “ato gratuito”, em que se<br />
reconhece o <strong>de</strong>samparo do eu e que se aproxima do que se convencionou<br />
chamar <strong>de</strong> Mal, mas que, num mundo em crise, justifica-se como um <strong>de</strong>svario<br />
do sujeito em busca dos próprios limites, movendo-se numa “aventura<br />
impossível <strong>de</strong> sonho e <strong>de</strong> extermínio”, nas palavras do Autor registra<strong>da</strong>s em<br />
seu Diário Completo. Está na raiz do domínio <strong>de</strong> Augusta sobre a família, do<br />
assassinato <strong>de</strong> Manassés <strong>por</strong> sua esposa, do vampirismo <strong>de</strong> Angélica e em<br />
tantos outros exemplos que se po<strong>de</strong> apontar na produção cardosiana.<br />
Girando sempre em torno <strong>de</strong>sse tema, estão as referi<strong>da</strong>s personagens<br />
“gauches” que, na impossibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> encontrarem um espaço acolhedor no<br />
mundo, procuram refúgio <strong>de</strong> suas angústias na dissolução <strong>de</strong> seus egos e dos<br />
que os cercam em um <strong>de</strong>sejo que transcen<strong>de</strong> qualquer relacionamento viável –<br />
e traz, para a escritura cardosiana, indisfarçáveis traços românticos:<br />
GINA (ar<strong>de</strong>nte e suplicante): Queria, Renato, que você me <strong>de</strong>sse<br />
todo o amor que lhe fosse possível. Não o amor comum, mas uma<br />
espécie <strong>de</strong> amor que não existiu ain<strong>da</strong>, um amor como só o<br />
adivinham os con<strong>de</strong>nados, ou os leprosos <strong>de</strong>sta vi<strong>da</strong>! Preciso <strong>de</strong> um<br />
pouco <strong>de</strong> chama para o meu ser gelado, para a pobre alma<br />
aprisiona<strong>da</strong> que carrego comigo! (CARDOSO, s/d:25)<br />
Para caracterizar essa busca angustia<strong>da</strong> <strong>de</strong> suas personagens, <strong>Lúcio</strong><br />
<strong>Cardoso</strong> prioriza suas reali<strong>da</strong><strong>de</strong>s internas tornando-as referências prioritárias<br />
em seus cenários romanescos ou dramáticos. Não há, conseqüentemente,<br />
qualquer preocupação com a fi<strong>de</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> espacial ou tem<strong>por</strong>al em termos <strong>de</strong>