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Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...

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e impossibilita qualquer sentimento <strong>de</strong> compaixão no universo do Autor.<br />

164<br />

Por isso, nesse contexto, o amor é uma busca con<strong>de</strong>na<strong>da</strong> à frustração:<br />

os relacionamentos têm sempre a marca do fracasso, seja <strong>de</strong>ntro dos padrões<br />

sociais aceitos (é o caso do <strong>de</strong>sencontro entre Ma<strong>da</strong>lena e seu marido, Pedro):<br />

Pedro voltara a <strong>de</strong>scansar junto à vidraça. “Meu Deus, como eu o<br />

amo!” pensou Ma<strong>da</strong>lena repentinamente, fixando os seus ombros e<br />

as suas mãos nervosas. Oh! se ela pu<strong>de</strong>sse, erguer-se-ia, iria até ele<br />

e, tomando-lhe as mãos, enrolaria nelas os seus cabelos. Por um<br />

instante, estariam confundidos <strong>de</strong>ntro do mesmo pensamento e, na<br />

obscuri<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> sala, não ouviriam o vento e não sentiriam senão as<br />

panca<strong>da</strong>s sur<strong>da</strong>s <strong>de</strong> seu coração. (CARDOSO, 1936:93)<br />

Era odioso que aquela creatura [Ma<strong>da</strong>lena] viesse se intrometer<br />

assim na sua vi<strong>da</strong>. Não podia su<strong>por</strong>tar que ela se colocasse acima<br />

<strong>de</strong>le próprio, esquecendo as suas faltas magnanimamente. Odiava<br />

aquela magnanimi<strong>da</strong><strong>de</strong>... Pedro fitava-a. Sentia agora, pesando<br />

minuto <strong>por</strong> minuto, na sua vi<strong>da</strong>, a presença <strong>da</strong>quela mulher que não<br />

amava. Si fechasse os olhos ouviria a sua voz. Si se tratasse <strong>de</strong>ntro<br />

do quarto, ela o chamaria.<br />

Ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, que há muito tempo a odiava... Mas só há poucos dias<br />

percebera com niti<strong>de</strong>z que a vi<strong>da</strong> entre os dois era impossível (...)<br />

(CARDOSO, 1936: 204)<br />

seja na transgressão, como é o caso do suposto incesto entre Nina e André.<br />

Aliás, a relação entre os dois remete a outro tópico, o <strong>da</strong> família. Tanto<br />

os irmãos <strong>de</strong> O Escravo quanto os Meneses (Crônica <strong>da</strong> Casa Assassina<strong>da</strong>),<br />

para citar apenas dois exemplos – e haveria muitos outros! –, inserem-se numa<br />

família em que os laços não são <strong>de</strong> amor, mas <strong>de</strong> ódio, inveja, <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong><br />

domínio – o que marca uma novi<strong>da</strong><strong>de</strong> na Literatura brasileira até então e<br />

encontra paralelo contem<strong>por</strong>âneo em Nelson Rodrigues, mas sem as cores<br />

fortes do dramaturgo carioca. Não tendo como recurso a máscara dos<br />

com<strong>por</strong>tamentos exagerados e grotescos do autor <strong>de</strong> Vestido <strong>de</strong> Noiva, a<br />

família cardosiana está muito mais próxima do universo do leitor/espectador e<br />

causa-lhe, <strong>por</strong> isso mesmo, o mal-estar do reconhecimento e, não raro, a<br />

rejeição.<br />

Cumpre atentar que, como se verificou, os típicos cenários cardosianos<br />

são ambientes <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes; suas personagens estão liga<strong>da</strong>s à “aristocracia”<br />

interiorana também <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte ou à média burguesia – excetuando-se as que

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