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Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...

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A companheira <strong>de</strong> <strong>de</strong>vaneio <strong>de</strong> Assur é a cunha<strong>da</strong> Aíla, que também se<br />

ressente <strong>de</strong> um <strong>de</strong>stino compartilhado <strong>por</strong> Ana Meneses: a <strong>de</strong> ter sido cria<strong>da</strong>,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> menina, para ser esposa, sem que outro <strong>de</strong>stino lhe tivesse sido<br />

acessível. E ambas, ressentindo-se <strong>de</strong>sse fato, imaginam que, em outras vi<strong>da</strong>s<br />

– ou noutro espaço –, talvez encontrassem maior felici<strong>da</strong><strong>de</strong>:<br />

“Des<strong>de</strong> criança fui educa<strong>da</strong> para atravessar esses umbrais que<br />

julgava sagrados, quer dizer, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o Sr. Demétrio dignou-se<br />

escolher-me para sua companheira permanente. Eu era uma menina<br />

ain<strong>da</strong>, e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então meus pais só trataram <strong>de</strong> cultivar-me ao gosto<br />

dos Meneses. Eu mesma (ah, padre! hoje sei disto, hoje que imagino<br />

como po<strong>de</strong>ria ter sido outra pessoa – certos dias, certos momentos,<br />

as clareiras, os mares em que po<strong>de</strong>ria ter viajado! – com que<br />

amargura o digo, com que peso secreto no coração...). (CARDOSO,<br />

1991: 120)<br />

Por outro lado, Ana também experimenta o sofrimento <strong>de</strong> Manassés,<br />

marido <strong>de</strong> Aíla. A volta do filho pródigo e a alegria que o cerca fazem nascer<br />

em seu coração a inveja e o ciúme: trabalhara arduamente para alimentar a<br />

família ume<strong>de</strong>cendo a terra ári<strong>da</strong> com o próprio suor e nunca recebera<br />

atenções semelhantes às <strong>da</strong>quele que retornava rico, exuberante e feliz,<br />

pondo em xeque o valor <strong>de</strong> sua obediência fiel <strong>de</strong> tantos anos. Ana, que<br />

<strong>de</strong>dicou to<strong>da</strong> a vi<strong>da</strong> a cui<strong>da</strong>r <strong>da</strong> casa dos Meneses, discretamente existindo<br />

para manutenção <strong>da</strong>quele clã, sentiu-se diminuí<strong>da</strong> pela presença <strong>de</strong> Nina na<br />

Chácara <strong>por</strong>que ela concentrava as atenções e elogios <strong>de</strong> todos <strong>da</strong> casa.<br />

Também n’A Crônica <strong>da</strong> Casa Assassina<strong>da</strong> (CARDOSO, 1991), era a vi<strong>da</strong> e a<br />

transgressão <strong>da</strong> outra que todos admiravam, não a sua renúncia – e a inveja e<br />

o ciúme são os sentimentos que cresceram em ambos os <strong>de</strong>sprezados.<br />

Outros pontos, que apareceram sutilmente em dramas anteriores, foram<br />

realçados no último, Angélica. A insistência na doença e na fragili<strong>da</strong><strong>de</strong> do outro<br />

como motivo <strong>de</strong> <strong>clausura</strong>, que Augusta usava para assegurar o domínio sobre<br />

Isabel, em O Escravo, reaparecerá nesse drama como argumento-razão para<br />

que Lídia aceite ficar na casa <strong>da</strong> protagonista fazendo-lhe companhia; o amor<br />

<strong>de</strong> Gina, que seu marido acha estranho e pelo qual sofre:<br />

(ERGUENDO O PULSO FERIDO) Isso são modos <strong>de</strong> amar? Até<br />

parece que procura arrancar alguma coisa <strong>de</strong> mim, sugar algo que<br />

não possui, um alimento, uma razão para viver. (CARDOSO, s/d:10)

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