Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...

Augusta, que se aproveita da situação para exercer seu poder à revelia da
vontade alheia. Frágil, a subjetividade “doente” é vítima das manobras sádicas
do seu “cuidador” que receberá, em troca, a obediência servil e os louvores à
sua bondade: Como você é boa, como é generosa, como seu coração é
grande! (CARDOSO, 1973:2). Para o espectador, que não está envolvido na
relação e que, de fora, observa os comportamentos, a declaração agradecida
de Isabel revela ironia da situação criada pelo Autor.
Nesse ponto, a conversa das irmãs volta-se para o assunto principal da
noite: o retorno de Marcos, o irmão que fora internado num sanatório há cinco
anos vítima de uma intensa crise nervosa. Isabel elogia as rosas que Augusta
colocou na sala, lamenta que não as tenham com mais freqüência, falam sobre
o quarto que está preparado para recebê-lo. Nesse momento, Isabel pergunta
por um jogo que fora de Silas.
É a primeira referência ao irmão mais velho. Embora morto há mais de
cinco anos, sua presença é forte na peça como se ele fosse mais uma
personagem representada por um ator. Tudo girará em torno da sua memória e
do rancor que Augusta guarda por ele. A partir de sua evocação, a peça se
abrirá em dois planos temporais: o presente e a rememoração. A maior parte
dos acontecimentos estará concentrada no segundo plano e essa foi uma
dificuldade para a apreciação da época. Embora Vestido de noiva seja ainda
mais radical (três planos: memória, realidade e alucinação), sua estrutura
espacial facilitou o trânsito de uma para outra dimensão temporal. Em Lúcio, os
dois tempos acontecem no mesmo espaço e o passado, que predomina, surge
apenas através do diálogo das personagens.
Pouco se sabe sobre Silas. Por Isabel, descobre-se que ele costumava
chegar embriagado em casa e que também gritava no alto da escada
(CARDOSO, 1973:7); por Marcos, que ele inspirava um estranho terror a Lisa,
companheira de infância e, mais tarde, sua mulher; por Lisa, que todos diziam
que ele era um menino triste e que a insultava porque ela era alegre demais
(CARDOSO, 1973:19). Numa conversa entre Marcos e Lisa, o espectador
conhece o sadismo de Silas (Uma vez obrigou-me a ficar de joelhos durante
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