Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...
Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...
Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Repasso na memória gran<strong>de</strong>s sucessos do momento: A rosa<br />
tatua<strong>da</strong>, <strong>de</strong> Tenesse (sic) Williams e A morte do caixeiro viajante, <strong>de</strong><br />
Arthur Miller. Isto a que chamam <strong>de</strong> carpintaria teatral, sim, é<br />
possível encontrar nelas. Alguma coisa mais expressiva, não.<br />
Ambas, impressas, não chegam a interessar <strong>por</strong> mais <strong>de</strong> vinte<br />
minutos. E vinte minutos <strong>de</strong>pois já estão completamente esqueci<strong>da</strong>s.<br />
É possível ver, implícita nessa nota, uma certa queixa ou <strong>de</strong>sdém em<br />
relação a uma acusação comum ao teatro cardosiano: a <strong>de</strong> que as peças <strong>de</strong><br />
<strong>Lúcio</strong> eram “literárias” <strong>de</strong>mais, boas como <strong>literatura</strong>, mas fracas como teatro<br />
<strong>por</strong>que não possuíam estrutura cênica, ou seja, a “carpintaria teatral” a que ele<br />
se refere <strong>de</strong>sprestigiosamente. Ele completa:<br />
Carpintaria teatral é a arte <strong>de</strong> manter sempre viva a atenção do<br />
público. E a atenção do chamado gran<strong>de</strong> público só se mantém pela<br />
exibição do que literariamente é mais grosseiro e mais repugnante.<br />
Prosseguindo, ain<strong>da</strong>, na sua avaliação dos dramaturgos recentes, <strong>Lúcio</strong><br />
<strong>Cardoso</strong> não consegue avaliar o alcance <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>da</strong>s conquistas:<br />
Ah, a voga dos gran<strong>de</strong>s autores teatrais. Piran<strong>de</strong>llo, <strong>por</strong> exemplo,<br />
menos do que pelo seu teatro, hoje tão visivelmente marcado pela<br />
<strong>da</strong>ta, sobreviverá pela época em que foi criado. Os Seis personagens<br />
cheiram terrivelmente a 1925. E absorvi<strong>da</strong> sua teoria <strong>da</strong> confusão<br />
<strong>da</strong>s personali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, que nos resta? A carpintaria, dirão. Mas as<br />
bibliotecas são vastos cemitérios <strong>de</strong> obras com imponente<br />
arquitetura teatral.<br />
Eugene O’Neill, que tantos entre nós ain<strong>da</strong> têm a ingenui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
su<strong>por</strong> o supra-sumo <strong>da</strong> quali<strong>da</strong><strong>de</strong> teatral, é um autor que caminha<br />
assustadoramente para a obscuri<strong>da</strong><strong>de</strong>. Há uma ligeira volta cria<strong>da</strong><br />
pela sua última peça, que dizem <strong>de</strong> tom autobiográfico. Mas isso<br />
pasará (sic) também, <strong>por</strong>que O’Neill é um autor <strong>de</strong> categoria<br />
subalterna. Sua carpintaria teatral é pesa<strong>da</strong> e anacrônica.<br />
Como se po<strong>de</strong> observar, <strong>Lúcio</strong> não alcançava a dimensão exata <strong>da</strong>s<br />
transformações pelas quais o teatro <strong>de</strong> seu tempo passava e o que alguns<br />
autores, <strong>por</strong> ele con<strong>de</strong>nados, representavam. Dessa enxurra<strong>da</strong> <strong>de</strong> críticas<br />
pouco perceptivas, o Autor salva apenas Shakespeare (que, obviamente, não<br />
lhe era contem<strong>por</strong>âneo!) que, segundo ele, não é apenas um “acontecimento<br />
<strong>de</strong> palco”, mas “um fenômeno poético”. Em outro artigo, arquivado sob o<br />
número 29, investe contra a quali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos temas apresentados nos teatros<br />
brasileiros:<br />
61