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Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...

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Bem sei o que me falta. Não tenho um só minuto <strong>de</strong> sossego <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

que pisei nesta casa. A única razão <strong>de</strong> ser que existe em mim, fatal e<br />

<strong>de</strong>cisiva, é o ódio.<br />

(...)<br />

(AVANÇANDO IMPETUOSA) Se ain<strong>da</strong> duvi<strong>da</strong>, escute: eu o o<strong>de</strong>io.<br />

Eu o o<strong>de</strong>io mortalmente. Tudo em mim estremece quando o vejo. E<br />

muitas vezes só reconheço em mim o que é vi<strong>da</strong>, pelo <strong>de</strong>sgosto que<br />

me causa a sua presença ou o que me vem <strong>da</strong>s suas mãos.<br />

(CARDOSO, s/d:21)<br />

E termina ameaçando o marido: “Você não <strong>de</strong>via me provocar, Renato.<br />

Bem sabe que ando muito nervosa e <strong>de</strong> vez em quando perco o controle <strong>da</strong>s<br />

minhas palavras.” (CARDOSO, s/d:23). Abatido com as <strong>de</strong>clarações <strong>da</strong><br />

esposa, Renato pergunta se não seria melhor que se separassem e ela reage:<br />

(ENCAMINHANDO-SE PARA ELE E FALANDO NUM TOM<br />

RAIVOSO E ESCARNINHO): Já sei, Renato, quer submeter-me ao<br />

<strong>de</strong>sprezo dos outros. Pois eu lhe confesso que às vezes imagino que<br />

só casou comigo para isto, para atingir este fim. Não se contenta em<br />

ver-me ultraja<strong>da</strong>, espezinha<strong>da</strong>. Quer que todos o saibam...<br />

(CARDOSO, s/d:23)<br />

O marido, ca<strong>da</strong> vez mais abatido e perplexo, afirma-lhe que é ela quem<br />

“<strong>de</strong>seja tudo o que está acontecendo” (CARDOSO, s/d:23) e Gina retruca que<br />

ele, com certeza, está sugerindo, como todos dizem, que é uma “mulher<br />

perversa”, uma “ordinária” (CARDOSO, s/d:23).<br />

Renato a repreen<strong>de</strong>, ela se <strong>de</strong>ixa cair numa poltrona e soluça,<br />

<strong>de</strong>clarando-se infeliz. Apie<strong>da</strong>do, o marido aproxima-se, lembra as alegrias e<br />

promessas do noivado, reafirma-lhe o amor que sente. Apaixona<strong>da</strong>, ela pe<strong>de</strong><br />

que ele não a <strong>de</strong>ixe sozinha, fala <strong>de</strong> seus sofrimentos: “Uma só voz existe<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> mim! ‘Quem sou eu?’ – e é como se fosse um grito primitivo,<br />

qualquer coisa aflita e <strong>de</strong>sampara<strong>da</strong> entre quatro pare<strong>de</strong>s <strong>da</strong> alma.”<br />

(CARDOSO, s/d:25). Renato volta a falar do médico e ela recusa, <strong>por</strong>que o<br />

profissional não saberia compreendê-la, mas pe<strong>de</strong> que ele a aju<strong>de</strong>:<br />

(ARDENTE, SUPLICANTE) Queria, Renato, que você me <strong>de</strong>sse todo<br />

o amor que lhe fosse possível. Não o amor comum, mas uma<br />

espécie <strong>de</strong> amor que não existiu ain<strong>da</strong>, um amor como só o<br />

adivinham os con<strong>de</strong>nados, ou os leprosos <strong>de</strong>sta vi<strong>da</strong>! Preciso <strong>de</strong> um<br />

pouco <strong>de</strong> chama para o meu ser gelado, para a pobre alma<br />

aprisiona<strong>da</strong> que carrego comigo!<br />

(...)<br />

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