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Dramas da clausura: a literatura dramática de Lúcio Cardoso por ...

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Este novo drama também se compõe <strong>de</strong> três atos e retoma o tema <strong>da</strong><br />

loucura, já explorado em O Escravo. Como assinalaram E.L. e Sérgio Brito, é<br />

em torno <strong>de</strong> Gina que todo o drama gravita. A seu respeito, os diálogos entre o<br />

marido e a emprega<strong>da</strong> esclarecem que era filha <strong>de</strong> um pai agressivo e <strong>de</strong> uma<br />

mãe submissa, que bor<strong>da</strong>va para esquecer os <strong>de</strong>sgostos 45 . Renato, o marido,<br />

apaixonou-se <strong>por</strong> ela logo que a conheceu e o noivado foi recebido com<br />

estranheza (“Gina?...” exclamavam. E eu não podia compreen<strong>de</strong>r aquele<br />

espanto... CARDOSO, s/d:15) e contrariou a mãe do noivo <strong>por</strong>que falavam<br />

tanta coisa a respeito <strong>de</strong>la (CARDOSO, s/d:16), mas não se esclarece mais<br />

na<strong>da</strong> quanto ao seu passado. Quando a peça se inicia, ela está casa<strong>da</strong> há oito<br />

meses e, um mês <strong>de</strong>pois do casamento, Renato começou a perceber-lhe sinais<br />

<strong>de</strong> perturbação.<br />

O drama não revela nenhuma preocupação quanto à localização<br />

espacial. A primeira rubrica anuncia apenas que a cena ocorrerá em uma<br />

Sala, numa casa burguesa, com uma esca<strong>da</strong> ao fundo, conduzindo<br />

para o alto. Os móveis estão <strong>de</strong>sarrumados, há uma ou duas<br />

ca<strong>de</strong>iras tomba<strong>da</strong>s, uma toalha escorrendo <strong>da</strong> mesa: o aspecto geral<br />

é nu e <strong>de</strong>sconfortável. (CARDOSO, s/d:3)<br />

Quando as cortinas se abrem, a sala está vazia. “Ouve-se um grito <strong>de</strong><br />

homem, agudo e doloroso” (CARDOSO, s/d:3) e uma exclamação: “Gina!”.<br />

Depois <strong>de</strong> uma pausa, aparece Renato <strong>de</strong>scendo as esca<strong>da</strong>s “aspecto<br />

<strong>de</strong>sorientado, apertando uma <strong>da</strong>s mãos” (CARDOSO, s/d:3) e escon<strong>de</strong>ndo um<br />

ferimento. “Ele vai se abater junto à mesa, on<strong>de</strong>, durante um minuto, em<br />

silêncio, exprime o maior <strong>de</strong>sespero.” (CARDOSO, s/d:3). Chama <strong>por</strong> Júlia,<br />

“uma cria<strong>da</strong> mais ou menos idosa” (CARDOSO, s/d:3), pe<strong>de</strong>-lhe gaze, algodão<br />

e iodo e pergunta se ela já chamou o dr. Victor.<br />

Enquanto a mulher lhe faz um curativo, ele pergunta “como tem passado<br />

a patroa ultimamente” (CARDOSO, s/d:4). Júlia respon<strong>de</strong> que ela vai “Menos<br />

45 SCHAPOCHNIK informa que “O ato <strong>de</strong> costurar e bor<strong>da</strong>r fazia parte <strong>da</strong> rotina dos afazeres<br />

domésticos, e seu conhecimento era como um pré-requisito para a boa dona-<strong>de</strong>-casa” (1998:490). Em<br />

contraparti<strong>da</strong> e marcando seu afastamento <strong>da</strong> mãe e <strong>da</strong> postura feminina tradicional <strong>da</strong> época, Gina vai<br />

<strong>de</strong>testar agulhas e linhas: “Mas eu nunca bor<strong>de</strong>i coisa alguma e tenho horror às linhas e agulhas. Não<br />

posso me esquecer <strong>de</strong> meu pai, <strong>da</strong> sua brutali<strong>da</strong><strong>de</strong>, do extraordinário número <strong>de</strong> toalhas que minha mãe<br />

<strong>de</strong>ixou antes <strong>de</strong> morrer”. (CARDOSO, <strong>Lúcio</strong>. A Cor<strong>da</strong> <strong>de</strong> Prata, folha 58. A peça, inédita, consta do<br />

Arquivo do Autor na Fun<strong>da</strong>ção Casa <strong>de</strong> Rui Barbosa, no Rio <strong>de</strong> Janeiro. A ortografia foi atualiza<strong>da</strong>.)<br />

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