HELÂNIA CUNHA DE SOUSA CARDOSO A POESIA ... - Educadores
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lado vivo de suas imagens. Essa preocupação é perceptível principalmente no momento em<br />
que os dois artistas tematizam o processo da criação. Vale lembrar que tematizar o<br />
processo da criação vai além do uso da metalinguagem. Significa também produzir uma<br />
arte que está em constante processo de renovação de seus meios expressivos.<br />
Muitos leitores críticos de João Cabral observaram que o projeto estético do poeta,<br />
em relação ao panorama do Modernismo brasileiro, instiga um esvaziamento semântico,<br />
propondo a palavra poética como resultante de um processo criador que se debruça sobre si<br />
mesmo 69 . Nesse sentido, João Cabral tece o desligamento da sua arte da tradição, por viver<br />
numa sociedade tecnológica e capitalista, e oferece a sua imagem como a do poeta que é<br />
destituído da aura de gênio.<br />
Assim, a diferenciação ou inovação da poética cabralina estaria não só no seu<br />
distanciamento da tradição, como na sua ruptura, pela dessacralização do poeta e da criação<br />
poética, quando há a negação do derramamento emocional, que é substituído pela ação,<br />
processo ilimitado pela busca da palavra.<br />
Já observamos que João Cabral não propõe a arte como a imitação da realidade e<br />
nem pretende apresentá-la como denúncia de uma alienação coletiva, manipulada e de<br />
fundo ideológico. Pelo contrário, a sua poética é antes um instrumento cortante, abrindo<br />
fendas para denunciar a cristalização das idéias, para corroer um real socialmente<br />
inculcado. Através do despojamento do significado, abre espaços para que a significação –<br />
salpicada de ideologias – seja racionalmente corroída. Entre o sensível (real) e o vazio<br />
(surreal), entre o lírico e o social, João Cabral abre espaços para que a palavra se<br />
movimente, conduzindo o leitor para o processo da feitura do texto, em sua material<br />
concretude, decodificando o real social pelo eco, pelo secagem do lírico, como propõe<br />
69 Essa é a opinião de Reinaldo Martiniano Marques (1983).<br />
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