HELÂNIA CUNHA DE SOUSA CARDOSO A POESIA ... - Educadores
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vai aos poucos entreabrindo-a.<br />
Ou então é que essa folhagem<br />
vai ficando impercebida:<br />
porque terminada a dança<br />
embora a roupa persista,<br />
a imagem que a memória<br />
conservará em sua vista<br />
é a espiga, nua e espigada,<br />
rompente e esbelta, em espiga.<br />
(MELO NETO, 1986, p. 127)<br />
Como nenhuma das metáforas apresentadas disse a mulher/bailadora, resta na<br />
memória a imagem de uma “espiga nua e espigada”. O que se tem da mulher é a sua forma,<br />
assim como a poesia que existe no poema não está no sentimento daquele que diz a mulher,<br />
ou na beleza da bailadora e de seus movimentos e, sim, na forma como se organiza o texto,<br />
nos seus elementos significantes. A linguagem que trata da mulher é constantemente<br />
revista, como são revistas as imagens que a imitam, imagens “descarnadas, que deixam<br />
visíveis os seus “esqueletos”, isto é, as suas linhas estruturais básicas” (CAMPE<strong>DE</strong>LLI &<br />
ABDALA JR., 1988, p.00). Tal procedimento revela a preocupação do poeta em tornar o<br />
poema independente de sua visão individual. Através da superposição de visões, de formas,<br />
o poeta minimiza os efeitos da perspectiva individual, tão valorizada pelos poetas da<br />
tradição romântica.<br />
Evidencia-se então a importância da arquitetura do poema. Esta arquitetura está no<br />
uso de palavras concretas e no rigor como estas palavras são organizadas. Enumeradas ou<br />
permutadas num mesmo texto, ou em textos diferentes, as palavras, como um tear, tecem<br />
num sentido e destecem noutro os fios das imagens femininas.<br />
Sabemos, no entanto, que a imagem da dançarina espanhola associada ao fogo não<br />
é exclusiva de João Cabral de Melo Neto. Antes do poeta brasileiro, Rainer Maria Rilke<br />
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