HELÂNIA CUNHA DE SOUSA CARDOSO A POESIA ... - Educadores
HELÂNIA CUNHA DE SOUSA CARDOSO A POESIA ... - Educadores
HELÂNIA CUNHA DE SOUSA CARDOSO A POESIA ... - Educadores
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
ou andando, entre a angústia e a pressa<br />
de uma cidade que abalroa,<br />
que exige de quem anda proa,<br />
onde quem anda entre choques<br />
ou se esgueira como quem foge.<br />
Cardozo levava seu poema:<br />
a poesia não leva a pena<br />
de fazê-la, a pena é abstrata,<br />
é o fazer, re-fazer, guardá-la.<br />
E nele vai sem romantismos:<br />
nem o de vir de paroxismos<br />
nem o mais de moda e moderno,<br />
de escalar fingidos infernos.<br />
Ele vivia com seu poema<br />
como outros vivem com sua crença:<br />
a dele é o poema do momento,<br />
que leva sem mudar de gênio.<br />
No Recife, em todas as horas,<br />
no Rio, quem melhor o ignora,<br />
eis como escrevia, me disse,<br />
o poeta que fez o Recife.<br />
Assim, não deu trabalho aos prelos:<br />
se sequer cuida de escrevê-los!<br />
Se só se alguém lhe pede um poema<br />
escreve algum que ainda lembra!<br />
O exilado indiferente<br />
A esse recifense de praias<br />
obrigam-no a deixar seu mapa:<br />
outro pernambucano, truão,<br />
(nada é do grego, Agamenão)<br />
disse que o não queria mais<br />
no espaço de que é capaz.<br />
Seqüestram-no amizades boas,<br />
às carreiras, para as Alagoas<br />
e, dos Maceiós, num navio<br />
vem viver federal, no exílio<br />
(que ele habitaria sem queixa,<br />
nunca de camarinha e mesa).<br />
De calça e paletó de amianto,<br />
ei-lo entre os cantados encantos,<br />
sem sentir que esse mar que o cerne<br />
é o Atlântico do Nordeste:<br />
de Guarabira, Pirangi,<br />
Carne de Vaca, Serrambi.<br />
Recifense, a um cria de engenho,<br />
ditou as canas de seu tempo,<br />
e impaciente, a um mestre-de-obras,<br />
que espera a planta há mais de uma hora,<br />
enquanto diz das sutilezas<br />
da poesia e escrita chinesas:<br />
“Qual, é inconcebível, meu caro,<br />
no Rio, onde o último é o trabalho,<br />
você quer preceder à antiga<br />
conversa de China e poesia.”<br />
Não canavieiro pernambucano,<br />
abria exceção para Campos.<br />
É em Campos que Maria Luísa<br />
e ele ouvem a chuva, sem camisa.<br />
Viagem à Europa e depois<br />
Antes da Guerra, fora à Europa.<br />
Bebeu-a até a última hora.<br />
Por cá, a poesia é sempre o dengue<br />
do falso índio, homossensualmente.<br />
No Nordeste, Freyre e a reação<br />
para trazer a bola ao chão.<br />
Mas é coisa de romancista<br />
não de política, polícia.<br />
Volta da Europa ao “Lafaiete”,<br />
como se inda ontem lá estivesse.<br />
Escreveu três poemas na Europa<br />
dois se apagaram na memória.<br />
Compõe alguns poemas, ainda,<br />
mas quase todos viram cinza,<br />
porque, completados, ninguém<br />
216