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Tese 8 - Neip

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Em decorrência da possibilidade de atingir algumas doses de liberdade através do<br />

consumo, os grupos outsiders que ascendem à condição de consumidores, podem se<br />

sentir tão próximos da liberdade corrente quanto os grupos estabelecidos. Se antes do<br />

deslocamento da ênfase na produção para a ênfase no consumo a perspectiva<br />

civilizatória objetivava um modelo inexorável de controle das emoções individuais para<br />

definir as fronteiras do progresso social, atualmente, o controle é construído através da<br />

liberação das emoções, ou mais precisamente, da institucionalização das emoções e dos<br />

desejos, oferecendo no mercado o que antes esteve culturalmente proibido, suspenso, e,<br />

através dessa oferta, vender um projeto de liberdade. Gradativamente, a felicidade<br />

enquanto estado de espírito (Platão, 1996), vem sendo trocada pelo desejo de consumir<br />

felicidade. Hoje, ela já pode ser obtida por um preço que se pode pagar - obviamente,<br />

para alguns, esta obtenção paga é mais complexa, porém, é nessa luta que as<br />

representações são ressignificadas.<br />

Partindo desta reflexão, ao invés de eleger a culpa como reguladora dos habitus<br />

sociais, como era comum cinquenta anos atrás, cada vez mais o “slogan da hora” parece<br />

ser: Enquanto a vida lhe consome, consuma a vida! “O estímulo de novos desejos toma<br />

o lugar da regulamentação normativa, a publicidade toma o lugar da coerção e a<br />

sedução torna redundantes ou invisíveis as pressões da necessidade”<br />

(Bauman:1998,185), sem preconceitos se dirigindo tanto para quem pratica esportes<br />

radicais, quanto para quem frequenta cultos neopentecostais. O que imputa culpa ao<br />

indivíduo não é mais o fato dele transgredir alguma proibição à sua liberdade ou<br />

desviar-se das normas para obter satisfação, mas sim, o fato de não gozar desta, pois já<br />

nem é preciso necessariamente transgredir ou desviar para gozar satisfação. Hoje tudo<br />

tem um preço e a oferta é para todos, e mesmo quem não pode pagar, pode ao menos,<br />

desejar consumir.<br />

Entretanto, não se deve operar uma redução da cultura de consumo a um cenário de<br />

hedonismo anômico, a uma ausência de princípios morais que pode levar a modelos de<br />

liberdade e felicidade autodestrutivos. Se por um lado, o consumidor é livre para desejar<br />

obter satisfação, por outro, ele tem o “dever” de desejar uma satisfação segura. A<br />

liberdade contemporânea demanda segurança e não é por acaso que nos banners e<br />

outdoors encontra-se cerveja com 0% de álcool, café livre de cafeína, doces sem açúcar,<br />

cigarros que não contêm tabaco. Não é por acaso que as comunidades de usuários de<br />

drogas cada vez mais constroem suas práticas com mecanismos para redução de riscos,<br />

como também não é por acaso que a lucrativa indústria de antidepressivos se apropria<br />

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