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Tese 8 - Neip

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pesquisador estivesse distanciado do campo, o que no mínimo, seria uma desconstrução<br />

da relação sujeito-objeto que se buscou para atingir a familiaridade em questão.<br />

Gradualmente, fui me tornando parte das galeras e cheguei a “ficar” com uma das<br />

estudantes, o que acredito me abriu algumas portas, pois a partir de então, eles já não<br />

demonstravam se incomodar com minha presença – pelo menos não aparentemente –<br />

mesmo quando a droga que o grupo estava consumindo era cocaína 139 . Após ficar com a<br />

referida interlocutora por alguns dias, eu passei a ser o Cara que ficou frequentando o<br />

grupo, sem que eles se referissem a mim como aquele que chegou como pesquisador,<br />

como outsider. Em última instância eu estava naquele setting de consumo sob a<br />

representação de ter sido o Cara de uma das usuárias, e uma das que tinha voz ativa.<br />

Essa questão da voz ativa e liderança é outro ponto importante a ressaltar nessas<br />

articulações comunitárias. Sempre havia um líder ao redor do qual a atividade do grupo<br />

circulava. A liderança podia ser apontada em função dos capitais culturais sustentadas<br />

pelos membros da comunidade, como por exemplo; possuir uma casa ou um carro para<br />

efetuar o consumo, possuir mais dinheiro para adquirir ou simplesmente pelo carisma<br />

representado. Ao contrário da representação dominante que projeta os usuários de<br />

drogas como caóticos e desorganizados, não tive dificuldades para observar nessas<br />

comunidades que sempre havia um líder ou líderes para evocar o uso, para indicar um<br />

roteiro a se fazer na noite ou direcionar uma discussão. Sempre existia alguém que<br />

ajudava a controlar o descontrole, um líder facilmente perceptível em cada galera que<br />

frequentei. Sem precisar ter sido estritamente pragmático em minha abordagem, sempre<br />

que possível me aproximava dos líderes, ou talvez eles se aproximassem de mim, pois,<br />

queira ou não, se eu estava fazendo uma pesquisa na qual “sua tribo” estava inclusa, se<br />

eles eram realmente líderes, tinham que me deixar claro que eles também estavam de<br />

olho em mim. Mas isso não implicou em animosidade, apenas percebi que dos grupos<br />

em foco, eram sempre estes líderes os que mais queriam saber detalhes sobre mim e<br />

sobre a pesquisa. Essa é outra questão que merece ser levantada. As relações de poder<br />

sustentadas por outsiders tanto em relação a outsiders quanto a estabelecidos, por<br />

heterodoxas e hedonistas que parecessem ser tais comunidades, mantêm estruturas<br />

semelhantes às encontradas em relações estabelecidas. Assim, os outsiders aos grupos<br />

139 - digo isto porque geralmente o consumo de cocaína é cercado de maiores cuidados do que o de<br />

maconha - mesmo a maconha pelo seu cheiro sendo mais facilmente identificável. Para consumi-la com<br />

mais tranquilidade, os usuários se afastam do grupo maior. As diferenças de custo pesavam nesse ponto, e<br />

se no caso da maconha geralmente me ofereciam, no caso da cocaína isso nunca ocorreu.<br />

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