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Tese 8 - Neip

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Mata prefere não consumir substâncias psicoativas para poder trabalhar com maior<br />

margem de segurança, e desse modo sua liberdade está em optar por não consumir no<br />

momento em que não acredita ser adequado. Se, enquanto residente de medicina, ela<br />

encontra resistência até para discutir a redução de danos, na cena eletrônica, Mata<br />

encontra um setting receptivo para suas práticas, até em função de sua ludicidade. Já<br />

alguns ambientes, onde esta estratégia de controle começa gradativamente a ser<br />

processada, não são tão lúdicos quanto o setting da cena eletrônica:<br />

Buda - Trabalhei dois anos no Presídio Lemos Brito e lá, a maconha é que segura<br />

a cadeia. Os caras fodidos, os “couro de rato 183 ”, fumam qualquer coisa que brota, o<br />

que chamam de cigarro “pacaia”. Eu fazia uma redução de danos com eles, não só em<br />

relação a sexo, mas também em relação ao uso de drogas.<br />

Em meio a controles formais que lhes permitem poucas opções de consumo 184 os<br />

“couro de rato” fumam o que brota, bebem o álcool que produzem 185 , injetam o que pica<br />

e assim por diante. Nessa condição de exclusão de “direito ao PROCON”, o trabalho de<br />

Buda é possibilitar controles informais que reduzam o excesso de risco configurados no<br />

setting. Um presídio é um setting configurado em torno dos riscos, do seu controle e de<br />

sua ausência. A afirmação de Buda de que “a maconha é que segura a cadeia” corrobora<br />

a percepção sustentada por um professor na primeira parte da pesquisa e levanta a<br />

seguinte reflexão: o consumo de drogas em certas configurações sociais serve como<br />

ferramenta para processar e reforçar os controles formais 186 . Se muitos dos internos<br />

estão ali por causa de suas ligações com o tráfico de drogas, é no consumo de drogas<br />

que muitas das relações de poder por trás dos muros oscilam entre a pacificação e o<br />

conflito direto.<br />

As possibilidades de relacionar drogas com riscos e danos nos settings desta pesquisa<br />

são várias: riscos e danos relacionados aos usos de drogas, às representações dos<br />

usuários e às atividades de trabalho. No caso de Buda que é residente, é possível<br />

observar como ele interpreta seu consumo de maconha como prevenção aos riscos<br />

183 - os “couro de rato” são a escória na hierarquia prisional. Nesse sentido, esses presos não se percebem<br />

como outsiders, pois não manifestam aspirações em reverter tal estigma. São desviantes tipificados.<br />

184 - se estão encarcerados num presídio estes indivíduos são consumidores falhos pela própria condição<br />

de exclusão em que se encontram, excluídos do consumo da plena cidadania!<br />

185 - a pinga destilada pelos presos na cadeia é chamada “Maria Louca”, como se percebe no filme<br />

Estômago, (Jorge, 2007).<br />

186 - sobre esta constatação e sua reflexão ver capítulo seguinte.<br />

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