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Tese 8 - Neip

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Três questões sobressaem nessa fala. Primeiramente, o interlocutor realiza uma<br />

leitura crítica de que sua prisão não se deu por causa da maconha, mas sim por questões<br />

ideológicas, culturais, ou seja, não fazendo uma naturalização de que a maconha tem<br />

uma representação inalienavelmente negativa. Em segundo lugar, o seu registro de que<br />

no setting panóptico da prisão, não apenas o traficante tem um status diferenciado dos<br />

outros presos, como também as drogas são utilizadas como mecanismos reguladores da<br />

tensão, servindo para controlar a violência do cárcere tanto pelos presos quanto pela<br />

equipe diligente, num silencioso acordo tácito - o que leva a refletir se fora da prisão, de<br />

certa forma também a maconha não se aplique ou possa ser aplicada a tal objetivo 207 .<br />

Por fim vemos que no processo de configuração desse setting, o traficante desfruta de<br />

um status muito maior que um acadêmico com seu diploma, diploma que chega a ser<br />

um sinal de estigmatização, numa flexibilização de valores geralmente representados de<br />

modo estático. E as surpreendentes falas de Esculápio continuam:<br />

Esculápio - Quando saí da prisão não ficou nenhuma sequela em relação<br />

à maconha. Foi até interessante que no dia que eu saí, saí com uma amiga e<br />

fumei com ela no carro e foi uma experiência fantástica, inacreditável e<br />

amedrontadora porque eu também senti...a prisão passa a ter um efeito...cê<br />

sente falta como se fosse um útero. Eu tive mais medo fora do que lá<br />

dentro.. como se você sentisse falta da prisão. (VALENÇA:2005,146)<br />

Bem, aqui talvez seja possível interpretar que “Eu tive mais medo fora do que lá<br />

dentro”, tenha conexão com a prioridade que a reinserção social passa a representar<br />

para o interlocutor, isto é, a partir de então, ele deverá erguer seus próprios mecanismos<br />

de controle, para que o estigma, representado pelo seu confinamento ao cárcere, não o<br />

condene perpetuamente ao rótulo de traficante, quando estiver fora da prisão. Nesse<br />

sentido, a maior ameaça encontrava-se fora da prisão, o que gera insegurança. Ele<br />

também afirma que sua relação com a maconha não ficou marcada pela negatividade de<br />

ter sido preso em função de sua posse, assim não se tornando uma representação<br />

estigmatizada e traumática. Mas sua experiência psicoativa no cárcere não se resumiu<br />

ao consumo de maconha:<br />

Esculápio - Tive experiências na prisão com crack, mesmo sabendo que é<br />

algo assim, nocivo, mas eu quis ter a experiência pra saber até do que eu iria<br />

falar. Eu estava na prisão quando o crack começou a ser introduzido lá. A<br />

primeira vez eu estava numa cela com muitos garotos, entrou de uma forma<br />

207 - como foi possível perceber na citada relação entre senhores e escravos nas entressafras das<br />

plantações da cana-de-açúcar, (item 1.7, pg.40).<br />

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