06.04.2015 Views

Tese 8 - Neip

Tese 8 - Neip

Tese 8 - Neip

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

5.6 - Reflexões finais<br />

As conexões de sentido entre uso de drogas e reflexões acadêmicas não são<br />

novidades apesar do estranhamento que estas interpretações ainda podem proporcionar.<br />

No livro "A Farmácia de Platão", o filósofo Derrida indica que no período clássico da<br />

cultura grega o conceito de phármakon sustentava uma maleabilidade de sentidos,<br />

inclusive podendo ser interpretado tanto por remédio quanto por veneno. Já na França<br />

do começo da década de 1970 quando o livro foi publicado havia uma tendência<br />

hermenêutica dominante em representar o phármakon exclusivamente como remédio,<br />

pois, o vocábulo veneno guardava proximidade com o vocábulo droga, que estando<br />

interpenetrado a valores considerados subversivos, se encontrava politicamente<br />

estigmatizado. Derrida resgata a percepção de que uma característica fundamental do<br />

phármakon é não estar naturalizado enquanto substância, não sendo necessariamente<br />

remédio ou veneno. Contudo, a questão central é que o conceito na antiguidade não era<br />

aplicado exclusivamente às substâncias psicoativas 219 , mas também às escrituras,<br />

documentos que àquele período eram produzidos exclusivamente pelas mãos dos<br />

frequentadores das academias filosóficas 220 .<br />

Se, interpretando Derrida, a escritura – ou o produto do conhecimento em condições<br />

materiais de consumo - pode ser contemporaneamente representada também como um<br />

phármakon, a Universidade e especificamente as Ciências Humanas são o campo<br />

comunitário que representa por excelência o local da produção de escrituras. Nesse<br />

sentido, quando acadêmicos – professores e/ou estudantes – elegem discutir<br />

publicamente com a sociedade a possibilidade das drogas poderem ser significadas<br />

como remédios, não estariam indicando também que a própria cultura acadêmica pode<br />

ser um phármakon agindo como antídoto contra o veneno da cultura proibicionista?<br />

Talvez a possibilidade de interpretação da comunidade acadêmica enquanto<br />

phármakon forneça um sentido a informação de que a primeira manifestação pública<br />

pela descriminalização da maconha no Brasil tenha acontecido na Faculdade de<br />

Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP em 1976 (Henman & Pessoa:1986).<br />

219 - Aristóteles denominava phármakon o prazer curativo proporcionado pelas atividades miméticas,<br />

(ELIAS & DUNNING: 1992, 101).<br />

220<br />

- nas atividades acadêmicas que caracterizaram o período, o uso de substâncias psicoativas fazia parte<br />

da cultura da temperança: “Epicarmo considerava a lírica incompatível com a sobriedade, e Simónides<br />

pensava o mesmo em relação a comédia”, (ESCOHOTADO: 2008, 151). Em relação ao consumo de<br />

vinho Platão aponta em As leis que este: “permite a alma adquirir pudor, e ao corpo a boa saúde e a força”<br />

(ESCOHOTADO:2008, 152).<br />

290

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!