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Tese 8 - Neip

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3.3 - O reencantamento da vida cotidiana<br />

3.3.1 - Em busca do que?<br />

Interpretado o ponto de vista da maioria dos interlocutores, seria mais preciso falar<br />

em habitus sociais ao invés de vícios ou mesmo dependência para descrever seus<br />

comportamentos em torno do consumo de drogas 150 . Hábitos porque se 41% desses<br />

interlocutores consomem maconha diariamente e outros 50% consomem maconha e<br />

álcool semanalmente, estamos nos referindo a um consumo habitual e não ocasional que<br />

acontece uma vez por mês ou mesmo por ano. Por outro lado, apenas 5% desses<br />

interlocutores relacionam de modo sistemático sua produção e atuação em papéis<br />

cotidianos com o consumo de drogas, daí seria pouco preciso falar em “vício”. Nesse<br />

enquadre é possível cogitar que o consumo de drogas enquanto reincidência habitual de<br />

um comportamento que põe em risco os interlocutores só vem a obter sentido se for<br />

possível ser representado como um processo no qual as drogas enquanto objetos de<br />

consumo são reencantadas, se acrescentando às suas propriedades químicas, memórias<br />

afetivas positivas. Nas palavras dos próprios interlocutores é perceptível que há ligações<br />

miméticas no momento de consumo, resgatando sentidos que foram atuantes em<br />

alguma circunstância do passado:<br />

Mozart - Pra mim droga sempre teve no meio de descobertas. Ninguém sente o que<br />

sentiu a primeira vez (cantarolando): “a primeira vezzzz!/tudo começou/ a primeira<br />

vezzz!” (Risos).<br />

O sentido desse cantarolar pode ser interpretado como: ninguém sente o que sentiu a<br />

primeira vez, mas continua tentando sentir. A repetição de um comportamento em busca<br />

de uma representação mimeticamente carregada de sentido pode até ser interpretada<br />

psicanalítica ou filosoficamente como uma busca por resgate do estado primordial ou do<br />

eterno retorno ao ponto de partida. Mas Mozart ao transformar o axioma em música – o<br />

que neste texto quer dizer poesia – já demonstra estar dando algum sentido no mínimo<br />

momentaneamente prazeroso à sua busca. Já as palavras de Marley e de Hofmann<br />

150 - não é apenas no senso comum que a representação do “viciado” é dominante em detrimento da<br />

representação do usuário. Na base metodológica de muitas pesquisas, o uso na vida acaba sendo<br />

interpretado como se usar drogas uma vez, indicasse que o usuário se tornou dependente, quando não<br />

“viciado”.<br />

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