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Tese 8 - Neip

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A rave era de amplitude internacional; havia argentinos, italianos e alguns DJs<br />

ingleses, sendo estes últimos os responsáveis por trazer a maior parte das drogas<br />

sintéticas consumidas no evento. A tribo dos ingleses, constituída por jovens na faixa<br />

dos 20 e poucos anos, estava em número de sete - quatro rapazes e três moças, todos<br />

com longos cabelos louros no estilo Rastafari. No embalo da meia-noite, ao som de<br />

intensos ritmos eletrônicos, eles começaram a se atirar na lama, deitando e rolando,<br />

corpos sobre corpos, indistintos e sorridentes, convidando outros a fazer o mesmo.<br />

Quase uma hora depois eles permaneciam enlameados, dançando no mesmo ritmo,<br />

inclusive depois da música ter cambiado a batida. Duas das pessoas que me<br />

acompanhavam comentaram entre risos, como era decadente aquele ritual, não vendo o<br />

sentido daquele frenesi, ao som de uma música no mínimo estridente e repetitiva. Olhei<br />

para um deles, que ostentava seus longos cabelos grisalhos, e que não muito tempo<br />

atrás disse que o sonho de juventude dele e de sua esposa era poder ter estado em<br />

Woodstock, e lancei uma provocação: se eles acharam por demais significativo, – no<br />

sentido político e estético – que no filme Woodstock, certo movimento de jovens dos<br />

anos 60 festejasse seus valores culturais exatamente dançando desnudos na lama e<br />

usando substâncias que alteravam a consciência ao som de uma música estridente, o<br />

que mudou para que quase a mesma cena, cerca de 40 anos depois, recebesse uma<br />

ressignificação quase oposta? A resposta mais rápida que um dos quatro formulou, foi<br />

de que: “não somos mais estudantes, somos pais de família!” Rimos e brindamos a<br />

reflexão.<br />

Se “ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”, como diz a música de<br />

Belchior, há controvérsias, mas de qualquer modo, pais de família também demandam o<br />

consumo de liberdade, não apenas de segurança. Um dos meus acompanhantes se<br />

mostrando enfadado com o estilo musical em curso resolveu procurar alguma droga<br />

para aproveitar a estadia, mas como ele não conhecia ninguém acabou sendo mal<br />

sucedido em sua busca. Eu sabia que meus acompanhantes eram usuários de maconha,<br />

álcool e eventualmente cocaína ou ácido, então resolvi ajudar entrando em contato com<br />

minha interlocutora. Foi uma espera rápida. Ela conseguiu um ácido com os ingleses e<br />

intermediou a transação para meu acompanhante. Este olhou para mim e gracejou: “Isso<br />

é melhor do que pó! E se vem da Europa, é sinal de qualidade garantida!” Minha<br />

interlocutora riu e me informou que boa parte daqueles presentes era universitária, mas<br />

essa informação ali não tinha nenhuma importância, o que importava era que cada um<br />

estivesse transmitindo uma “good vibe”. E observando, para tentar captar as boas<br />

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