Tese 8 - Neip
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Também foi perceptível que esses interlocutores possuíam uma bagagem<br />
informacional ampla e atualizada quando falavam sobre questões do momento – como<br />
em tese, se espera de um universitário, mas na prática nem sempre é o que se encontra -,<br />
geralmente manifestando não só informações, mas reflexividade no que dizia respeito à<br />
política, economia, música, cinema, sexo e principalmente sobre drogas.<br />
Se alguns dos interlocutores já faziam parte da minha rede de relações, o que eu<br />
precisei fazer foi utilizar a situação de entrevista como ferramenta de aproximação, um<br />
motivo para estabelecer contato que possibilitasse mais intimidade. Assim, consegui<br />
estabelecer – em certos casos, restabelecer – uma ponte que me permitiu um olhar mais<br />
próximo de seus estilos de vida. Com alguns eu fui a bares, com outros a festas ou<br />
shows, e com aqueles que frequentavam unidades de ensino onde o consumo de drogas<br />
era notório, cheguei a assistir aulas em suas turmas. Em 40% dos casos, cheguei a<br />
frequentar suas moradias, em situações outras que não as de entrevista, sendo que<br />
depois de concluído o trabalho de campo ainda mantivemos algum contato. Faz-se<br />
imprescindível assinalar o quão importante foi o contato inicial, em suas casas ou em<br />
seus ambientes de estudo/trabalho, pois aí já se podia perceber seus mecanismos de<br />
inserção e interação em suas áreas de atuação, seus controles informais. Os que<br />
moravam longe dos pais e eram fumantes de maconha, fumaram durante a entrevista, os<br />
que moravam com os pais, e dentre estes, nenhum era a favor do uso, preferiram ser<br />
entrevistados nas faculdades, onde alguns fizeram uso. Um usuário de cocaína, que<br />
morava só, cheirou a substância durante a entrevista. Nesse sentido, a casa e a rua são<br />
configuradas de acordo com a necessidade contingencial de adequação. Assim há mais<br />
liberdade em casa para consumir quando não há interdição familiar, principalmente<br />
para os que moravam sem os pais. Para estes universitários, a rua significava o risco<br />
desnecessário e que deve ser evitado. Já para aqueles que moravam com as famílias<br />
tradicionais, a rua era um “risco seguro” que valia a pena ser corrido, enquanto a casa<br />
dos “pais caretas” era seguramente um risco a ser evitado.<br />
Como busquei ganhar alguma familiaridade com o que para eles fosse familiar, é<br />
preciso registrar como seus estilos de vida me causaram algum impacto, não<br />
necessariamente positivo ou negativo, apenas como decorrência de algum nível inicial<br />
de estranhamento. Refletindo por este ângulo, as notas de campo não são trazidas em<br />
anexo e sim no corpo do texto, porque tais notas fazem parte da construção do campo,<br />
das ambivalências e aporias que encontrei diretamente no processo de construção dos<br />
dados. Colocar essas notas em anexo seria como colocá-las aparte do campo, como se o<br />
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