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Tese 8 - Neip

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as reflexões sobre si mesmo, como figura móvel, interconectado com uma<br />

‘rede de significados que ele mesmo ajuda a produzir” (2005: 94).<br />

Abraço esse raciocínio ao sublinhar que, indo além de uma observação participante,<br />

devo transformar a fronteira entre observar e participar numa interface que permita a<br />

observação plena de minha participação. Assim, altero levemente a formatação do texto<br />

para não perder a confiança dos interlocutores, de forma que com essa flexibilização na<br />

minha participação ainda possa manter o foco centrado nas observações. Dessa forma<br />

ganha o projeto, pois ao interagir com o feedback dos interlocutores, acrescento à<br />

perspectiva dialógica, um terceiro momento, dadivoso: além do receber e do dar, agora<br />

há a reação à informação dada. Com essa reação, também ganha o pesquisador, que<br />

segue seu curso sem dúvidas éticas quanto a seus mecanismos de aproximação e<br />

distanciamento, pois, talvez seja como já disse da Matta (1983: 34): “E só há dados<br />

quando há um processo de empatia correndo de lado a lado”.<br />

Numa dimensão analítica mais ampla, é perceptível que não estudo apenas as<br />

comunidades de usuários, também estudo a comunidade que eu e meus interlocutores<br />

configuramos em nosso processo dialógico, pois os três momentos da pesquisa – ir a<br />

campo, analisar dados e construir um texto – são momentos que devem ser observados<br />

numa perspectiva metodológica dadivosa. “A hermenêutica supõe ser quem descreve da<br />

mesma substância que aquilo que descreve. Ela requer uma certa comunidade de<br />

perspectiva” (Maffesoli: 2006, 29). Receber, reagir e repassar informações sobre<br />

consumo de drogas, eis dinâmica da comunidade de perspectiva em questão – e é a<br />

tensão manifesta no feedback dos interlocutores que faz com que o título dessa obra seja<br />

aporisticamente “consumir e ser consumido”. Eis por onde trilho o ofício de cientista<br />

social que tem por objeto de estudo uma comunidade estigmatizada.<br />

Ter configurado como interlocutores da pesquisa pessoas que estão em processo de<br />

construção de suas auto-imagens enquanto sujeitos sociais - apenas 36% dos<br />

interlocutores trabalham, e apenas 18% estão acima dos 30 anos - não faz do meu<br />

trabalho algo fácil. Por que eu deveria acreditar que jovens estudantes universitários<br />

usuários de drogas não oporiam resistência a uma possível ameaça de desconstrução de<br />

suas auto-imagens? Se de alguma forma esta pesquisa pode macular-lhes a<br />

representação, então serei colocado na posição de outsider ao grupo, sendo aquele que<br />

de alguma forma põe sua identidade em xeque. Contrariando as expectativas do<br />

pesquisador, o fato de tal pesquisa estar sendo realizada por alguém que tem um status<br />

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