15.04.2013 Views

o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

148 diAcríticA<br />

vras correntes. Há uma procura <strong>de</strong> <strong>de</strong>s-temporalizar a língua, <strong>de</strong><br />

a <strong>de</strong>s«nacionalizar» no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> a libertar <strong>de</strong> um código colectivo<br />

que obe<strong>de</strong>ce a normas, in<strong>do</strong> ao encontro <strong>de</strong> uma língua própria, <strong>do</strong><br />

próprio poeta, que cria os seus códigos – na linha <strong>de</strong> um ezra Pound:<br />

mas quem não queria criar uma língua <strong>de</strong>ntro da própria língua?<br />

eu sim queria<br />

(Hel<strong>de</strong>r, 2008: 168)<br />

Ao mesmo tempo, a complexida<strong>de</strong> rítmica que verificámos já no<br />

início da sua obra, em paralelo com a erupção temática e visual <strong>de</strong> um<br />

imaginário que se <strong>de</strong>s<strong>do</strong>bra em duas direcções, para a interiorida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

um inconsciente marca<strong>do</strong> pela infância e pelo corpo, e para a exteriorida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> um mun<strong>do</strong> elementar na escolha <strong>de</strong> tópicos precisos, essa<br />

complexida<strong>de</strong> acentua-se na combinatória perfeita <strong>de</strong>sses <strong>do</strong>is planos,<br />

formal e temático, como no poema «acima <strong>do</strong> cabelo radioso, / abaixo<br />

<strong>do</strong> cabelo» (i<strong>de</strong>m, 174), em que a repetição anafórica acima/abaixo<br />

acompanha esse jogo <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocação em paralelo <strong>do</strong> interior para o<br />

exterior, até à concentração final na figura <strong>do</strong> poeta:<br />

… saber a quantas<br />

translações estamos<br />

entre sujeito e acto, a quanto preto bic <strong>do</strong> escrito,<br />

auto <strong>de</strong> autor, a luz inteligente sobre o mun<strong>do</strong>,<br />

magnificência,<br />

e o mun<strong>do</strong>, entre visto e emenda<strong>do</strong> e rescrito (Hel<strong>de</strong>r, 2008: 175)<br />

Ao mesmo tempo que faz isso, esta língua articula-se com uma<br />

oralida<strong>de</strong> que <strong>de</strong>sperta ecos <strong>de</strong> um falar exterior à aprendizagem da<br />

língua: a presença <strong>de</strong>ssas frases ou expressões «colhidas» da boca <strong>de</strong><br />

alunos <strong>de</strong> português vai situar o poema no espaço <strong>do</strong> ensino, on<strong>de</strong><br />

a língua é/<strong>de</strong>ve ser adquirida na sua formulação canónica, mas ao<br />

mesmo tempo apresenta-nos uma fala em ruptura com as regras<br />

normativas, que conduz a uma «materialida<strong>de</strong>» <strong>de</strong>ssa língua na sua<br />

relação directa com o falante que <strong>de</strong>la se apropria e a trans/<strong>de</strong>-forma.<br />

Vai então sentir-se uma presença da própria língua que diz a língua,<br />

na sua elocução; e é esse plano oral que nos obriga a estarmos atentos<br />

à boca <strong>de</strong> on<strong>de</strong> nasce a língua, no seu quotidiano e na sua prática que<br />

(<strong>de</strong>s)obe<strong>de</strong>ce a todas as regras.<br />

O poeta coloca-se, ele próprio, nesse espaço escolar para <strong>de</strong>le se<br />

afastar em direcção a um dizer pessoal que encena a dramaticida<strong>de</strong>, o<br />

conflito entre o individual e o colectivo:

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!