15.04.2013 Views

o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

210 diAcríticA<br />

duas edições quinhentistas a forma «semicapro», aparentemente paroxítona.<br />

Digo «aparentemente», da<strong>do</strong> que não havia uniformida<strong>de</strong> na<br />

norma quinhentista no que concerne à colocação <strong>do</strong>s acentos (especialmente<br />

no que toca a palavras esdrúxulas), pelo que nada nos diz<br />

que Camões não pronunciasse a palavra (correctamente) como proparoxítona.<br />

Pois não há dúvida <strong>de</strong> que a palavra latina semicàper só po<strong>de</strong><br />

resultar, em português, na forma «semícapro». Assim se compreen<strong>de</strong><br />

que, em relação a esta forma, Francisco Rebelo Gonçalves tenha escrito:<br />

«o lat. semicàper, -pri exige, sem discussão, semícapros. Só se admitiria<br />

semicapros, paroxítono, se houvesse, e não há, razão métrica para a<br />

diástole» (2002: 273). Na nota 6 da página citada, Rebelo Gonçalves<br />

frisa o caso diferente que se nos <strong>de</strong>para no soneto 66 das rimas Várias<br />

– flores <strong>do</strong> lima <strong>de</strong> Diogo Bernar<strong>de</strong>s, on<strong>de</strong> os acentos métricos na 4.ª,<br />

8.ª e 10.ª sílabas exigem a forma paroxítona semicapros.<br />

Contra a acentuação proparoxítona se pronunciou José Gonçalo<br />

Herculano <strong>de</strong> Carvalho (1984: 105), que fundamenta o seu repúdio em<br />

<strong>do</strong>is argumentos. O primeiro, que recorre a noções inexactas <strong>de</strong> fonética<br />

latina, baseia-se na falácia <strong>de</strong> que «estan<strong>do</strong> a vogal breve da penúltima<br />

sílaba seguida <strong>do</strong> grupo ‘muta cum liquida’, a acentuação recaía,<br />

como é sabi<strong>do</strong>, facultativamente nessa sílaba ou na antepenúltima»<br />

– argumento que qualquer latinista saberá classificar <strong>de</strong> infunda<strong>do</strong>; 16<br />

quanto ao segun<strong>do</strong> argumento, <strong>de</strong> que a acentuação paroxítona é, no<br />

que toca à eufonia <strong>do</strong> verso em português, «ritmicamente <strong>de</strong> preferir»,<br />

posso <strong>de</strong> alguma forma solidarizar-me com ele (e compreen<strong>do</strong> até a<br />

sua sedução, também sentida pelo Prof. Aguiar e Silva; cf. 2008: 71,<br />

n. 27; 190, n. 9), mas em rigor não passa <strong>de</strong> impressão subjectiva que<br />

não po<strong>de</strong> ser confirmada nem refutada, porquanto em ambos os casos<br />

(Éclogas VI, 185; VII, 2) se trata <strong>de</strong> <strong>de</strong>cassílabos heróicos com acentos<br />

métricos na 6.ª e 10.ª sílabas, pelo que o acento <strong>de</strong> semícapro/semicapro<br />

é metricamente in<strong>de</strong>terminável, contrariamente ao caso <strong>do</strong> <strong>de</strong>cassílabo<br />

sáfico <strong>de</strong> Diogo Bernar<strong>de</strong>s, aponta<strong>do</strong> por Rebelo Gonçalves, em<br />

que o acento métrico na 8.ª sílaba recai justamente sobre «semicapro».<br />

16 A questão que se coloca, em latim, não tem que ver com o carácter «facultativo»<br />

da acentuação na pronúncia <strong>de</strong> uma palavra cuja penúltima sílaba, etimologicamente<br />

breve (como é o caso <strong>de</strong> semicaper), é seguida <strong>de</strong> oclusiva e líquida (palavra que seria<br />

sempre pronunciada com acentuação proparoxítona – a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Herculano <strong>de</strong> Carvalho<br />

<strong>de</strong> a forma <strong>de</strong> acusativo po<strong>de</strong>r ter «facultativamente» uma acentuação diferente da <strong>de</strong><br />

nominativo é <strong>de</strong>veras peregrina), mas sim com a licença poética <strong>de</strong> lhe <strong>de</strong>slocar o acento<br />

métrico para efeitos <strong>de</strong> escanção <strong>do</strong> verso. É facto que a palavra semicaper é rara em<br />

latim; todavia, a sua utilização mais conhecida, no v. 515 <strong>do</strong> Canto 14 das metamorfoses<br />

<strong>de</strong> Ovídio, pressupõe inequivocamente a acentuação proparoxítona.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!