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o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

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AindA AProPósito <strong>do</strong> soneto O DIA eM qUe eU NASCI MOURA e PeReÇA<br />

217<br />

O vocábulo <strong>do</strong> número 4 po<strong>de</strong>rá dar origem, também, a indagações<br />

eventualmente interessantes, uma vez que se emprega na épica e na lírica<br />

<strong>de</strong> Camões, mas parece <strong>de</strong> to<strong>do</strong> incomum na obra <strong>de</strong> outros poetas da<br />

sua geração, nomeadamente Ferreira, Caminha e Corte-Real.<br />

4. Ten<strong>do</strong> em conta o conjunto articula<strong>do</strong> <strong>de</strong> fenómenos que se<br />

verifica em «O dia em que eu nasci», o sintagma não te espantes preten<strong>de</strong><br />

carrear tão-somente uma parte, ainda que importante, <strong>do</strong> peso<br />

da minha argumentação. Com efeito, como exemplifica Aguiar e Silva,<br />

po<strong>de</strong> ir buscar-se um verso <strong>de</strong> Francisco Sá <strong>de</strong> Miranda (que, afinal,<br />

só terá faleci<strong>do</strong> em 1558, logo, a tempo <strong>de</strong> ser incluí<strong>do</strong>, embora sem<br />

segura datação, no lote <strong>de</strong> autores <strong>do</strong> terceiro quartel <strong>do</strong> século) para<br />

mostrar que não se espantar surge fora da obra <strong>de</strong> Camões. 7 eu próprio<br />

acrescentaria outros versos <strong>do</strong> poeta da Tapada: «a dó se bolverá,<br />

que no se espante», abrin<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s seus notáveis sonetos, e «quem<br />

quereis que não se espante», na fábula <strong>do</strong>s ratos <strong>do</strong> campo e da cida<strong>de</strong>,<br />

incluída na epístola ao irmão Mem <strong>de</strong> Sá. Para enriquecer a comparação,<br />

po<strong>de</strong>m acrescentar-se ainda versos <strong>de</strong> António Ferreira e Pêro<br />

<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Caminha que não mencionei anteriormente: «não esperas,<br />

nem temes, nem te espantas» (p. 351) e «nada me ofen<strong>de</strong>, nada turve,<br />

ou espante» (p. 357) <strong>do</strong> primeiro (ambos, curiosamente, da sua epístola<br />

a Sá <strong>de</strong> Miranda) e, <strong>do</strong> segun<strong>do</strong>, «Fílis, <strong>de</strong> quanto te amo não<br />

m’espanto» (p. 281), numa elegia, 8 e «não m’espanto bom João, qu’assi<br />

movesse», numa epístola (p. 920). Mas, como então escrevi, exemplos<br />

como estes «confirmam, afinal, como a forma <strong>de</strong> expressão <strong>de</strong>signada<br />

é incaracterística entre os coevos <strong>de</strong> Camões». Ao contrário <strong>de</strong> Miranda<br />

(nasci<strong>do</strong> ainda no século XV) e <strong>do</strong>s outros poetas da geração <strong>de</strong><br />

Ferreira (nasci<strong>do</strong> em 1528), on<strong>de</strong> a expressão não é utilizada, Camões<br />

recorre à construção morfológica não te espantes vezes suficientes para<br />

a consi<strong>de</strong>rarmos parte integrante <strong>do</strong> seu idiolecto. 9<br />

Da mesma forma que não se trata <strong>de</strong> saber se os <strong>de</strong>riva<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

verbo espantar e <strong>do</strong> substantivo espanto são incluí<strong>do</strong>s por outros poetas<br />

7 Vítor Aguiar e Silva, op. cit., p. 216.<br />

8 este poema, porém, não parece estritamente datável <strong>do</strong> terceiro quartel <strong>do</strong><br />

século XVI. D. Francisca <strong>de</strong> Aragão, i<strong>de</strong>ntificada pelo poeta com Fílis, embora tenha<br />

casa<strong>do</strong> com o embaixa<strong>do</strong>r castelhano Juan <strong>de</strong> Borja em 1576, não parece ter cessa<strong>do</strong>,<br />

apesar disso, <strong>de</strong> merecer os louvores e as <strong>de</strong>dicatórias <strong>de</strong> Caminha…<br />

9 Na canção «A instabilida<strong>de</strong> da Fortuna», a expressão não te espantes, tão incomum<br />

nas obras <strong>do</strong>s <strong>de</strong>mais poetas que po<strong>de</strong>m adscrever-se seguramente ao perío<strong>do</strong> circa<br />

1550-1575, surge uma vez mais (verso 95).

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