o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho
o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho
o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
62 diAcríticA<br />
Gostaria <strong>de</strong> terminar com a breve indicação <strong>de</strong> algumas das implicações<br />
<strong>de</strong> como esta «voz conversacional» po<strong>de</strong> ser significativa para<br />
pensar, no presente contexto, um conceito diferente <strong>de</strong> literatura mundial<br />
ilumina<strong>do</strong> por práticas <strong>de</strong> leitura e <strong>de</strong> escrita como as que aqui<br />
analisei relativamente a <strong>Herberto</strong> Hel<strong>de</strong>r. Através <strong>do</strong> seu «forte» uso<br />
da vulnerabilida<strong>de</strong>, parece-me que somos arrasta<strong>do</strong>s para o carácter<br />
audível <strong>do</strong> silêncio, para a forma como ele sempre tem uma qualida<strong>de</strong><br />
vocal. Uma forma <strong>de</strong> literatura mundial (e <strong>de</strong> poesia mundial, como no<br />
presente caso) é aquela que «ousa» (para utilizar o termo <strong>de</strong> <strong>Herberto</strong><br />
Hel<strong>de</strong>r) mostrar-se em permanente diálogo com as suas margens, em<br />
permanente esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> para melhor ser ela mesma.<br />
Ao aceitar a sua base <strong>de</strong> conversação, ela torna audível o ruí<strong>do</strong> produzi<strong>do</strong><br />
pelo diálogo às vezes emu<strong>de</strong>ci<strong>do</strong> que sempre se produz entre tradições<br />
divergentes – não apenas as que se reconhecem como entre si aparen-<br />
tadas mas, justamente, as que inesperadamente se cruzam como<br />
lugares <strong>de</strong> distância. «Vozes comunicantes» seria, <strong>de</strong>sta forma, uma<br />
metáfora para a totalida<strong>de</strong> da poesia <strong>de</strong> <strong>Herberto</strong> Hel<strong>de</strong>r, e o seu específico<br />
mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> fazer «constelar» (o termo é também <strong>de</strong> <strong>Herberto</strong>) um<br />
enorme conjunto <strong>de</strong> tradições diferenciadas, canónicas e experimentais,<br />
vernaculares e estrangeiras, alheias e indígenas, antigas e mo<strong>de</strong>rnas,<br />
eruditas e populares, escritas e orais. Trata-se <strong>de</strong> um complexo <strong>de</strong><br />
vozes que po<strong>de</strong> chocar (colidir). Também indica o que a poesia po<strong>de</strong><br />
ser (e o que a poesia herbertiana, especificamente, ten<strong>de</strong> a ser): uma<br />
conversa entre várias distintas vozes, que ressoam no interior <strong>de</strong> uma<br />
que a todas elas replica.<br />
bibliografia<br />
Barrento, João (2002), «A terceira voz: quem fala no texto traduzi<strong>do</strong>?», o Poço<br />
<strong>de</strong> babel. Para uma Poética da tradução literária, Lisboa, Relógio d’Água,<br />
pp. 106-22.<br />
Buescu, Helena (2005), cristalizações. fronteiras da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, Lisboa, Relógio<br />
d’Água.<br />
—— / João Ferreira Duarte (2007), «Communicating voices: <strong>Herberto</strong> Hel<strong>de</strong>r’s<br />
experiments in cross-cultural poetry», forum for mo<strong>de</strong>rn language studies,<br />
43(2), pp. 173-186.<br />
—— (2008), emendar a morte. Pactos em literatura, Porto, Campo das Letras.