15.04.2013 Views

o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

252 diAcríticA<br />

certo anarquismo 11 , ao passo que outras se pren<strong>de</strong>m aparentemente<br />

com a a<strong>do</strong>pção <strong>de</strong> uma sub-cultura urbana, alternativa e artística.<br />

Se «Absurdina», como vimos, versa sobre os «speeds baratos», a<br />

cocaína («quem snifa por bics») e o ópio («quem por causa <strong>de</strong> uma<br />

papoila vai até à China»), «Piloto Automático» foca exclusivamente<br />

os prazeres <strong>de</strong> Baco. A narrativa acontece «quan<strong>do</strong> soa a meia-noite»<br />

e gira em torno da imagem <strong>do</strong> automóvel, cuja marcha se vai trans-<br />

forman<strong>do</strong> ao ritmo <strong>do</strong> efeito <strong>do</strong> álcool. Se, a princípio, «começa a<br />

capotar», pois o autor sente «um monstro» <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> si que «procura<br />

envenenar», logo <strong>de</strong>pois, consuma<strong>do</strong> o tributo ao <strong>de</strong>us das uvas, move-<br />

-se em «piloto automático», fican<strong>do</strong> o autor, sintoniza<strong>do</strong> no «programa<br />

esquecer», «dissolvi<strong>do</strong> num luar / até ao amanhecer». O prazer que<br />

daqui se infere coli<strong>de</strong> com a <strong>de</strong>scrição <strong>do</strong>s efeitos metabólicos <strong>do</strong><br />

consumo, a qual <strong>de</strong>nuncia o seu carácter <strong>de</strong> excesso:<br />

• Rezo a Baco uma oração<br />

Sinto o fíga<strong>do</strong> a explodir<br />

em cada gole uma opção<br />

Um <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> virar.<br />

Com: whisky puro<br />

Sangria<br />

Vinho maduro<br />

Xerez d’Andaluzia (…)<br />

(«Piloto automático», in <strong>de</strong>feitos especiais, 1984)<br />

em «O paciente», os efeitos da bebida não se resumem ao<br />

fíga<strong>do</strong>, abarcan<strong>do</strong> sobretu<strong>do</strong> danos colaterais a nível mental. Mas o<br />

autor refere-se a este paciente na terceira pessoa, <strong>de</strong>marcan<strong>do</strong>-se da<br />

respectiva <strong>de</strong>bilida<strong>de</strong> com uma asserção <strong>de</strong> força, <strong>de</strong> quem consegue<br />

«beber e continuar <strong>de</strong> pé»:<br />

• Receito-lhe o mar e o campo, enfim, que pare <strong>de</strong> beber<br />

Isso <strong>de</strong> ver baratas tamanhas e outros insectos a mexer…<br />

Não é por certo hereditário nem tem a ver com a educação<br />

(Relaciona-se com esse péssimo hábito que tem<br />

De estar com um copo na mão) (…)<br />

Na vida há quem se afogue na pura paixão ou na fé<br />

Mas a posição mais complicada é beber e continuar <strong>de</strong> pé<br />

11 esta questão aflora numa entrevista <strong>de</strong> há um ano (cf. Andra<strong>de</strong> e Marques,<br />

2008). Perante a pergunta «em que ponto está o seu anarquismo?», Reininho respon<strong>de</strong>:<br />

«É pura e simplesmente estético. A minha i<strong>de</strong>ologia não é nem <strong>de</strong>us nem chefes, porque,<br />

precisamente, tenho vivi<strong>do</strong> sem uns nem outros. e, se calhar, eles existem.»

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!