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o conto insolúvel de Herberto Helder - Universidade do Minho

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o NONSeNSe que fAz senti<strong>do</strong>(s)<br />

233<br />

Por vezes, a aliteração surge isolada no corpo <strong>do</strong> poema, ocupan<strong>do</strong><br />

um único verso:<br />

• O corpo é porco porque quer<br />

(«Corpus», in tu<strong>do</strong> o que você queria ouvir, 1996)<br />

Outras vezes, contu<strong>do</strong>, ela percorre o texto na íntegra, povoan<strong>do</strong>-o<br />

<strong>de</strong> reflexos fónicos <strong>de</strong> efeito encantatório:<br />

• Linda<br />

lourinha loura luna<br />

Liga o letreiro<br />

Levanta o lençol e aluga-se<br />

Lá vai o primeiro<br />

Lenta lentamente<br />

O leito à lupa lembra um livro lambi<strong>do</strong> lúgubre<br />

Li<strong>do</strong> ao luar no farol<br />

Lânguida como a lã que vês <strong>do</strong>bar<br />

(«Farol», in mosquito, 1998)<br />

Ou não fossem as letras a matéria das canções, há a consi<strong>de</strong>rar,<br />

ainda ao nível das figuras <strong>de</strong> construção, o paralelismo, recurso rítmico<br />

por excelência e aquele que talvez mais assuma a vocação musical<br />

<strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> textos. Consistin<strong>do</strong> numa correspondência sintáctica,<br />

lexical, semântica e rítmica entre estruturas frásicas (a propósito da<br />

discussão sobre o tópico, cf. e.g. Leech 1969 e Kugel 1981), os paralelismos<br />

<strong>de</strong> Rui Reininho ocorrem, regra geral, através da repetição 6 <strong>de</strong><br />

lexemas em posição inicial <strong>do</strong> verso – ou seja, através da anáfora –<br />

produzin<strong>do</strong> assim uma batida rítmica <strong>de</strong> vaivém:<br />

• ele há gente que vive <strong>de</strong> si<br />

ele há vícios <strong>de</strong> que a gente se ri (…)<br />

ele há músicos qu’eu nunca ouvi<br />

ele há estilistas qu’eu nunca vesti<br />

ele há críticas qu’eu nunca percebi (…)<br />

(«Senti<strong>do</strong>s pêsames», in os Homens não se querem bonitos, 1985)<br />

6 A importância da repetição para Reininho está patente numa entrevista em que,<br />

insta<strong>do</strong> a dizer quais os truques composicionais <strong>de</strong> que não prescin<strong>de</strong>, respon<strong>de</strong>: «Da<br />

repetição. eu sou um tipo mais ou menos rítmico. Acho que é uma tentativa <strong>de</strong> ritmar,<br />

portanto, <strong>de</strong> tentar encaixar o ritmo com estas coisas que a gente ouve: o eléctrico a<br />

passar, com o «trum-trum trum-trum». Os comboios, por exemplo, é muito importante.<br />

Foi por isso que eu escolhi mais este tipo <strong>de</strong> música. Acho que foi por causa <strong>do</strong>s comboios,<br />

porque eu gosto daquele [imita] tum-tch-ta-tch-tum-tch-ta...» (Lopes, 2009).

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