Baixar - Proppi - UFF
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Este capítulo procura expor essa codificação religiosa transmitida por meio dos canais selecionados<br />
pelos intelectuais da comunidade muçulmana sunita carioca. Alguns dos meios de<br />
transmissão e comunicação dessa codificação já foram apresentados no capítulo anterior, pois<br />
ou diziam respeito à própria estrutura ritual da comunidade – caso das orações, sermões, jejuns<br />
–, ou serviam para marcar um posicionamento para fora, socializando também recémrevertidos<br />
– caso dos cursos de árabe e religião. O objetivo aqui é analisar o caráter e a forma<br />
dessa codificação, seu conteúdo, a lógica interna, explicitando as estratégias que estão envolvidas.<br />
Assim, ao tratar da khutbah novamente, não pretendo retomar as descrições que já a-<br />
presentei no capítulo anterior, mas focar nos discursos emitidos, propósitos, forma e intenção.<br />
Assim também nas aulas de árabe e religião. Além disso, analiso também as publicações materiais<br />
e eletrônicas da comunidade, também entendidas como estratégicas na codificação religiosa.<br />
3.1 – Os ‘intelectuais’ da comunidade<br />
Pensar a codificação religiosa da comunidade muçulmana sunita carioca significa levar em<br />
consideração um quadro altamente dinâmico e complexo de possibilidades de interpretação e<br />
comunicação da doutrina religiosa. O quadro é dinâmico porque envolve, como já apontei<br />
anteriormente, todo um conjunto de circunstâncias que flexibilizam o acesso e a possibilidade<br />
dos mais variados atores sociais interferirem nos debates sobre o que é o ‘verdadeiro Islã’<br />
(Stenberg 1996). O estabelecimento de uma ortodoxia, a constituição de uma tradição que lhe<br />
fundamente, se dá em meio a um jogo complexo de relações de poder (Asad 1986). Além<br />
desse quadro global, há as circunstâncias locais com as quais a comunidade se vê envolvida,<br />
de modo a atualizar debates transnacionais em suas dinâmicas locais (Pinto 2005:232). Tais<br />
dinâmicas estão ligadas aos mecanismos que controlam o acesso ao conhecimento religioso<br />
na comunidade, e que mecanismos vinculam o acesso ao conhecimento religioso a posições<br />
de poder na estrutura hierárquica. Qualquer flexibilização será a partir desses mecanismos,<br />
filtros que qualificam, mais do que simplesmente selecionam os que estão aptos a interferir.<br />
Na comunidade carioca, como aponta Gisele Chagas, a autoridade religiosa é concebida<br />
a partir do domínio do conhecimento religioso. Afirma:<br />
Na comunidade muçulmana do Rio de Janeiro, o papel de autoridade religiosa é<br />
conferido ao membro da comunidade que publicamente demonstra ter mais conhecimento<br />
dos textos doutrinais e das práticas rituais do que os demais membros. Este<br />
conhecimento precisa ser continuamente revertido em autoridade que, por sua<br />
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