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Baixar - Proppi - UFF

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de de interrupções no fluxo normal ditado pelo texto-base 55 . Essas participações dos alunos<br />

inserem elementos não previstos, não controlados ou revisados. Além de permitir o surgimento<br />

de novidades e diferenças, podem também descontrolar a ordem estabelecida para a aula.<br />

Se o primeiro elemento parece trazer contribuições positivas, a perda de controle, potencialmente<br />

nociva, é remediada por uma capacidade muito bem exercitada dos professores de retomar<br />

seus argumentos e conjuntos de ideias iniciais. No caso de Fernando, que frequentemente<br />

dividia a aula com Sami, esse elemento ‘surpresa’, essa novidade no esquema estável planejado<br />

causou desordem suficiente para que, em dadas situações, o recurso à figura de Sami fosse<br />

necessário. Note-se a figura de Fernando contava com muito prestígio frente à comunidade,<br />

prestígio fundado em seu conhecimento da religião islâmica. Sami, no entanto, encarnava a figura<br />

da autoridade, ponto de apoio e segurança, revestido de um ‘carisma professoral’ (Pinto<br />

1999:84) frente aos alunos e outros membros da comunidade.<br />

Não são raras as circunstâncias que indicam a importância da figura de Sami como<br />

professor carismático. Na maior parte das vezes, as aulas eram divididas entre Sami e Fernando,<br />

com o predomínio da fala 56 recaindo em Sami. Nas situações em que Sami, por alguma razão,<br />

estava impossibilitado de comparecer à mesquita, Fernando sozinho assumia a aula. Podia<br />

também ser o caso de Sami estar disponível para a aula, presente à mesquita, e Fernando<br />

assumir o controle, o que sinaliza sua ascensão em uma estrutura hierárquica de domínio do<br />

conhecimento religioso frente à comunidade local.<br />

Um significativo exemplo da desordem que uma intensa participação dos alunos pode<br />

inserir na aula aparece no momento em que uma pergunta posta pelos alunos não pode ser respondida.<br />

Em uma aula conduzida por Fernando, com Sami sentado a observar, uma aluna faz u-<br />

ma pergunta sobre a posição do Islã a respeito do sexto sentido humano, segundo ela, muito<br />

discutido pela psicologia contemporânea. A aula versava sobre a crença muçulmana nos anjos.<br />

A exposição buscava marcar a posição do Islã em especial no que diz respeito à figura de<br />

Satanás. Segundo a cosmologia cristã, Satanás é um anjo decaído, que se rebela contra o poder<br />

de Deus. Fernando tratava de expor que para os muçulmanos essa não é uma explicação<br />

satisfatória, visto que os anjos não são dotados de livre-arbítrio. São servos de Deus e somente<br />

seguem seus desígnios. O Islã, ao contrário, acredita que Satanás é de uma natureza diferente<br />

55 Chagas (2006:109) chama a atenção para uma mesma configuração nas aulas oferecidas na mussala da Lapa.<br />

“…a metodologia seguida nesse curso também se assemelha muito às práticas educacionais brasileiras, pois se<br />

permitia que durante as aulas fossem feitas perguntas para o ‘professor’, possibilitando interações entre este e os<br />

‘alunos’.”<br />

56 Cf. Bourdieu, Passeron (1968:22), citado em Pinto (1999:83), para o privilégio da fala professoral.<br />

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