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nesse conjunto de discussões da época, como vimos nos autores anteriores, que é a magia. O<br />
que diferencia a magia da religião? Ambos são sistemas de crenças e práticas, mas sistemas<br />
opostos. Comungam diversos elementos, como as divindades, objetos, ritos, mas repelem-se<br />
mutuamente. A magia teria sempre algo de antirreligioso, ao passo que a religião vê a magia<br />
com desagrado, repulsa, nojo, uma clara relação de repugnância mútua. A diferença fundamental<br />
reside no fato de que a religião constitui igreja, ou seja, uma comunidade moral: “Uma<br />
sociedade cujos membros estão unidos por se representarem da mesma maneira o mundo sagrado<br />
e por traduzirem essa representação comum em práticas idênticas, é isso o que chamamos<br />
uma igreja.” (Durkheim 1996:28) A magia não tem por finalidade constituir tal comunidade<br />
ou qualquer outra. “Não existe igreja mágica. […]. O mágico tem uma clientela, não<br />
uma igreja.” (Durkheim 1996:29). Durkheim define assim o seu objeto de estudo (Durkheim<br />
1996:32):<br />
Chegamos, pois, à seguinte definição: uma religião é um sistema solidário de crenças<br />
e de práticas relativas a coisas sagradas, isto é, proibidas, crenças e práticas que<br />
reúnem numa mesma comunidade moral, chamada igreja, todos aqueles que a ela<br />
aderem. O segundo elemento não é menos essencial que o primeiro, pois, ao mostrar<br />
que a ideia de religião é inseparável da ideia de igreja, ele faz pressentir que a religião<br />
deve ser uma coisa eminentemente social.<br />
A religião constitui uma comunidade moral e este é o seu grande diferencial, não só da<br />
magia, mas da ciência. A oposição religião/magia em Durkheim é correlata de outra oposição<br />
fundamental no seu pensamento, sociedade/indivíduo. No que se refere à ciência, a questão é<br />
mais complexa, uma vez que a centralidade da ciência na vida em sociedade moderna é apontada<br />
por Durkheim como um dos elementos que convocam o sociólogo à reflexão. A ciência<br />
assume o papel especulativo da religião, domina o real. A parte final da obra de Durkheim<br />
dedica-se a discutir o lugar e papel da religião no mundo contemporâneo, e nesse momento é<br />
inescapável referir-se à ciência. A primeira das grandes modificações que Durkheim insere no<br />
debate do momento diz respeito à própria definição da religião. Diferentemente de Tylor e<br />
Frazer, que definem a religião fundamentalmente apenas como um sistema de crenças, formas<br />
clássicas das definições intelectualistas de um fenômeno eminentemente abstrato, cognitivo,<br />
uma forma de pensamento; e de William Robertson Smith, cuja definição mínima da religião<br />
passa pela prática do totemismo, Durkheim articula as duas esferas – sistema de crenças e<br />
sistema de práticas – na sua definição do fenômeno religioso.<br />
O conflito ciência X religião seria uma disputa sobre quem tem competência para falar<br />
sobre o real, no que a ciência assume a função especulativa da religião. “No entanto, ela [a<br />
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