Baixar - Proppi - UFF
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constitua enquanto tais 37 . Ainda assim, é preciso apontar para o fato de que o profeta, mesmo<br />
em sua dominação carismática, produz uma codificação do sistema religioso e, nesse sentido,<br />
é um racionalizador, na medida em que organiza, reorganiza, sistematiza, depura, um sistema<br />
abstrato e coeso.<br />
A análise clássica de Weber sobre as afinidades eletivas entre o capitalismo moderno,<br />
sua racionalidade econômica fundada no cálculo, e a ética religiosa protestante, fundada na<br />
valorização do trabalho e no ascetismo intramundano (Weber 2004[1904-5]), é central nesse<br />
conjunto de demonstrações da religião como agente de racionalização do mundo moderno. A<br />
organização de seitas protestantes na América (Weber 1974:347-370) mostra como uma instituição<br />
religiosa se transforma em uma prática com sentidos e finalidades econômicas justamente<br />
por estar fundada em uma ética racional.<br />
Lucien Lévi-Bruhl (1857-1939) – Razão civilizada e desrazão primitiva<br />
Lévy-Bruhl é um autor instigante para este trabalho exatamente na medida em que vem da<br />
filosofia para se inserir no debate antropológico a respeito da racionalidade ou irracionalidade<br />
dos povos primitivos frente às capacidades cognitivas do homem (branco) moderno. Lévy-<br />
Bruhl estabelece uma espécie de ponto médio, opondo-se à Tylor e Frazer, aproximando-se<br />
das propostas de Durkheim, mas deste último também divergindo profundamente. Apresenta<br />
uma posição diferente da antropologia britânica por partir da posição oposta a Tylor e Frazer<br />
que, como vimos, tomam o indivíduo como modelo básico de saída. Já desde seus primeiros<br />
trabalhos em filosofia, apresenta o debate acerca da moralidade e as ciências da moral, em<br />
diálogo com a filosofia neo-kantiana, e sua descrença na possibilidade da ciência moral estabelecer<br />
‘universais morais’ (Tambiah 1990:84). Lévy-Bruhl ‘marca seu encontro com Durkheim’<br />
(Goldman 1994:9) ao defender que mentalidade humana e suas formulações morais<br />
dependem de condições sociais, variam no tempo e no espaço, e que a ciência da moral não<br />
poderia estabelecer, mas investigar essas formações.<br />
Em primeiro lugar, não se trata mais, para os filósofos, de fundar a moral. Essa excessiva<br />
pretensão, em um certo sentido respeitável, uma vez que proviria da necessidade<br />
de racionalizar a ação, foi sempre ilusória. A moral não tem mais necessidade<br />
de ser fundada do que a natureza, no sentido físico da palavra. Ambas têm uma existência<br />
de fato, que se impõe a cada sujeito individual, e que não lhe permite duvidar<br />
37 Para a distinção entre os personagens religiosos em Weber, ver Weber (1944), em especial capítulo V,<br />
segunda parte, “Sociología de la comunidad religiosa”: “… se distinguen los sacerdotes de los magos y de los<br />
‘profetas’ em cuanto que aquellos poseen un saber específico, una doctrina firmemente establecida y una cualificacion<br />
professional, mientras que éstos poseen dones personales (carisma) que ponen a prueba por médio del<br />
prodígio o de la revelacion personal, según se trate del mago o del profeta.” (Weber 1944:345-6).<br />
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