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da presença de enunciados científicos…” (2010:35). Ainda assim, diversas objeções à condição<br />

divina do texto podem ser apresentadas e Munzer, em estilo escolástico, antecipa cada<br />

uma delas e responde devidamente: ganância, ambição, desejo de poder, glória, unificação do<br />

povo árabe; até epilepsia como origem da revelação foi sugerido, além de influências judaicocristãs<br />

que retirariam sua originalidade. A cada uma delas o autor apresenta respostas que julga<br />

serem suficientes. Alguns de seus argumentos são fundamentados em Maurice Bucaille,<br />

um dos autores defensores de uma islamização da ciência moderna justificada na verdade científica<br />

das afirmações corânicas (Stenberg 1996:221ss).<br />

A posição do Alcorão frente ao conhecimento é de estímulo e entusiasmo: instiga o raciocínio,<br />

a observação; recomenda atenção a coisas materiais e também abstratas; exige o empenho<br />

individual e a troca de ideias. Sua exposição sugere diretamente que o Alcorão define<br />

as bases do conhecimento científico: rejeitar conjecturas onde é necessário certeza, o desprendimento<br />

das paixões e caprichos, evitar a mimeses cega e irracional valorizando o senso crítico,<br />

portanto; exige a prova como condição para aceitação, estimula o planejamento. Classifica<br />

o número de provas: sentidos, revelação do mensageiro, prova histórica e prova lógica.<br />

Uma vez estabelecido o que o Alcorão, livro revelado, entende por espírito científico,<br />

Munzer Isbelle analisa o processo de consolidação da sunna, as tradições e ditos do profeta<br />

Muhammad – por meio de procedimentos formais, racionais, empíricos, com constituição de<br />

cadeias de transmissão das tradições (isnad), a repressão à invenção de tradições por motivos<br />

espúrios. As tradições possuem um complexo e variegado sistema de classificação, cujo propósito<br />

é atender as exigências corânicas de objetividade e rigor no conhecimento produzido.<br />

Uma epistemologia como essa produziu uma civilização gloriosa, que valorizava a sabedoria,<br />

propiciou o desenvolvimento científico e não conhecia a dicotomia religião/ciência. Em sua<br />

história de glórias, o Islã consagrou-se por consolidar instituições de pesquisa e ensino, como<br />

escolas, academias de medicina, hospitais, bibliotecas, assembleias. Construiu um hall de sábios<br />

nas mais diversas áreas do conhecimento, indo de Ibin Sina (Avicena), Ibin Ruchid (Averróis),<br />

Al Kindi, Al Khuarizmi, Ibin Khaldun. O livro menciona ainda uma série de ‘testemunhos’<br />

de intelectuais ocidentais não-muçulmanos a respeito da racionalidade e cientificidade<br />

da civilização islâmica.<br />

Apesar de tudo, o Islã decai de sua glória. Chama à atenção a exposição das causas<br />

dessa estagnação, de modo que a moralização de seu argumento, sem desaparecer, passa pela<br />

localização dos efeitos negativos desse afastamento entre os muçulmanos e a prática do Islã<br />

nas estruturas sociopolíticas da civilização islâmica. A decadência da glória e o afastamento<br />

da prática são diagnosticados ainda à época dos Omíadas: a incorporação da monarquia here-<br />

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